quarta-feira, novembro 28

Regulamenta a profissão de historiador ou desregulamenta todas as profissões




Recentemente foi aprovado no Senado Federal o projeto de lei de autoria do senador Paulo Paim do PT (Partido dos Trabalhadores) – RS (Rio Grande do Sul), que regulamente a profissão de historiador, mas com fortes contestações de alguns senadores como o Pedro Taques do PDT (Partido Democrático Trabalhista) – MT (Mato Grosso) e Aloysio Nunes do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) – SP (São Paulo) que são contrários a regulamentação.

Há anos que as organizações como a FEMEH (Federação do Movimento Estudantil de História), C.A`s e D.A`s do curso de história e a ANPUH (Associação Nacional dos Professores Universitários de História) lutam pela regulamentação da profissão, porque é comum vermos sociólogos, advogados, juízes, médicos, políticos, diplomatas, desembargadores, profissionais liberais de outras áreas e até mesmo pessoas comuns que não tem diploma de nível superior se intitularem historiador. Você é contra? Não!
Mas é justo que historiadores, como eu, serem reconhecidos profissionalmente e ter essa profissão reconhecida. Quais os benefícios irão causar com a regulamentação? Vários, que irei apontar abaixo:

- > Com a regulamentação, os profissionais poderão de fato registrar os sindicatos ou criar um sindicato que represente a categoria e defenda os interesses, como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), por exemplo.

- > Os profissionais poderão lutar pelo piso salarial, que já é uma realidade em algumas profissões, como a dos professores por exemplo.

- > Criação de vagas nos concursos públicos para os historiadores, especialmente aos bacharéis (como eu) em museus, arquivos públicos, bibliotecas, e em repartições públicas e privadas. E como também se especificar nos planejamentos urbano nas cidades em caráter de preservar os patrimônios históricos, montar uma consultoria a respeito e o mercado pode se ampliar para esses profissionais.

- O historiador ficará cada vez mais valorizado e respeitado, tendo os direitos autorais sobre artigos, livros e pesquisas cada vez mais assegurado e reconhecido.

Se não é pra regulamentar a profissão de historiador, que desregulamentamos então todas as profissões. Porque se for analisar bem, grande parte das profissões hoje que são regulamentadas no passado não muito distante e ainda presente nos dias de hoje, eram feito por qualquer pessoa e nem precisavam de diplomas. O barbeiro exercia a função de dentista ou Tiradentes, usava a cachaça nos clientes como anestésico para diminuir a dor e arrancava os dentes com o alicate comum que às vezes nem era esterilizado.

Foi assim aqui no Brasil durante séculos até mesmo no século passado (XX), se não havia médico, recorria-se a feiticeiros e curandeiros, principalmente em interiores que ficam bem distante nas cidades, e a mulher quando quer dar luz ao filho? Recorria-se as parteiras, encarregadas no processo de parto. E se analisarmos bem, essas “profissões” ainda existem, inclusive aqui no Maranhão, em que feiticeiros, curandeiros e parteiras ainda existem. Principalmente nos interiores, onde a pobreza extrema e a exclusão social é o cenário predominante, especialmente nos povoados que ficam bem distante nas cidades, e o acesso a saúde pública é precária e a existência dos profissionais de saúde quase inexiste, principalmente os médicos.

E eles são os grandes conhecedores da medicina natural, principalmente de medicamentos oriundos de plantas que garante a cura de muitas doenças, e contribuem bastante na amenização do sofrimento das pessoas e no salvamento de vidas em localidades de difícil acesso.

Mesmo com todo esse trabalho, muitos dos médicos e enfermeiros vindos nas universidades se recusam a reconhecer o trabalho dessas pessoas, o tratam como ignorantes e desinformados, incluindo o preconceito e a discriminação social e racial, sendo uma eterna briga entre os médicos e enfermeiros com os curandeiras, feiticeiras e parteiras.

O que falar das construções civis? Muitas residências foram feitas sem precisar de engenheiro e arquiteto e com pedreiros que não tem sequer o ensino fundamental completo. O que falar das construções navais? Muitas embarcações artesanais são feitas por mãos talentosíssima de pessoas que nem sequer colocou os pés numa escola, e não precisam de auxilio dos engenheiros navais. Aqui no Maranhão temos as embarcações artesanais mais lindas do Brasil ou até mesmo do mundo, da mão de pessoas analfabetas ou semianalfabetas na maioria.



O caso de minha avó e mãe de criação é bem típico, uma senhora de 91 anos semianalfabeta (sabe somente ler e escrever, mas nunca colocou pés numa escola) que viveu uma vida de extrema pobreza, teve dezoito filhos e todo eles (exceto a caçula que nasceu na maternidade) nasceram em casa com ajuda de parteiras e vizinhas. 

Ao longo da sua vida ocupando terras por moradia na cidade São Luís, principalmente hoje no bairro da Liberdade (antigo matadouro) e Monte Castelo (antigo Areal na rua Raimundo Correa) que antes eram áreas de mangues, construiu com as próprias mãos a sua casa, mesmo sendo de taipa ou pau a pique.

Hoje moramos na cidade operária, numa casa construída por ela há pouco mais de 20 anos com ajuda de pedreiros que nem tinham sequer ensino fundamental completo, a casa é bem localizada com a rua asfaltada e o ônibus da linha Socorrão II que para praticamente na porta de casa, e até agora a casa em que eu moro junto com ela não desabou em nossa cabeça.
A minha avó já me deu muitos medicamentos naturais oriundo das plantas para cura de algumas doenças, nem que seja uma simples gripe, e até agora não tive sequelas por tomar esses medicamentos e estou muito bem de saúde. E até hoje se necessário, usamos ervas naturais e ela faz questão que se tenha guardado em casa.

A minha avó ao longo da vida precisou de médicos? Enfermeiros? Obstetra? Engenheiros? Arquitetos? Não! E ela está com 91 anos de idade e ainda bem lúcida e ativa por sinal, apesar dos problemas de esquecimento, mas natural para a idade avançada.

Médicos, enfermeiros, dentistas, obstetra, engenheiros civis, engenheiros navais, arquitetos e muitas outras profissões não deveriam ser regulamentados porque durante anos/séculos e até nos dias de hoje é exercido por pessoas que não tem diploma, mas fazem um grandioso trabalho em localidades distantes e difícil acesso, onde a pobreza extrema e a exclusão social predominam os cenários desses lugares, que muitas das vezes os profissionais de saúde e outras áreas se recusam a ir, preferindo ficar nas cidades, aqui no Brasil e no Maranhão é um grande exemplo.

Mas porque essas profissões são regulamentadas? É pra afastar e excluir esses “profissionais”, que majoritariamente são pobres a analfabetos. Numa forma de rebaixá-los a insignificância e serem visto como charlatões (aproveitando casos isolados para difamar e denegrir a todos os “profissionais”) e oportunistas pela sociedade, numa tentativa de perderem credibilidade a população e passar a confiar apenas nos profissionais diplomado. Não é a toa o desprezo dos médicos e enfermeiros com as parteiras e pessoas que trabalham com ervas medicinais. E assim também nas outras áreas, inclusive entre os professores não diplomados (chamados de leigos) e diplomados (maioria pedagogos).

Porque eles não querem a regulamentação da profissão de historiador? Para que os sociólogos, antropólogos, médicos, advogados, juízes, políticos, desembargadores, intelectuais, diplomatas e outros profissionais continuem se intitulando de historiadores. Esses profissionais que se intitulam historiadores são pobres? São analfabetos? Claro que não! Na maioria são da elite e ou se relacionam com as classes dominantes.

A história do Brasil ao longo deste cinco séculos é contado por viajantes aventureiros que vieram explorar as riquezas naturais e minerais, padres jesuítas, portugueses que vieram ao Brasil para administrar e representar a coroa portuguesa na colônia, artistas, intelectuais estrangeiros e membros da classe dominante e escravocrata, ou seja, é o olhar do colonizador, o olhar do estrangeiro e o olhar de uma classe dominante escravocrata no país.
Daí surgiram heróis e personagens que até hoje permanece vivo no imaginário da população, como a Princesa Isabel, por exemplo. Quem nunca ouviu frases do tipo? “Graças a Princesa Isabel a escravidão acabou...”, “Se não fosse a Princesa Isabel, os pretos estavam tudo no tronco levando chibatadas...”, esse é o exemplo de heróis criado pelas classes dominantes que ainda é vivo não só em nome de praças, avenidas, escolas, bairros, cidade (principalmente em municípios menores) e em repartições públicas, mas também no imaginário popular.

Cadê os escravos? Indígenas? Pobres? Excluídos e marginalizados? Durante anos/séculos foram esquecidos até mesmo nos livros de história, somente agora nos últimos anos com ajuda dos movimentos sociais e intelectuais acadêmicos que romperam com os paradigmas da elite intelectual e acadêmica estão refazendo os estudos e pesquisas sobre a história do Brasil e também dos estados, incluindo o Maranhão.

Através destes estudos, estamos conhecendo outros personagens que também fazem parte da história, como o Zumbi dos Palmares, por exemplo, de lutas e insurreições feitas por escravos, índios, pobres e marginalizados que lutaram contra a ordem colonialista e escravista imposta por colonizadores e a elite branca.

Estamos tendo a oportunidade de reestudar a história e pesquisar, história vista de baixo para cima e não de cima para baixo. Compreender a realidade posta em dias atuais, e justificar a condição de pobreza que ainda persiste no nosso país e quem se beneficia com essa situação, a quem interessa a manutenção da ordem e do status quo.

É compreensível que os senadores como Pedro Taques e Aloysio Nunes seja contrário a regulamentação, o próprio José Sarney para quem não sabe, também é contra. O motivo do José Sarney ser contra eu nem preciso explicar, porque sabemos e devemos reconhecer que o mesmo é um grande sábio e intelectual, independente da sua atuação politica.

Porque além de político é escritor também, o mesmo afirma que adora ler e escrever, lembro-me numa entrevista da Tv Mirante feito por uma repórter perguntando a ele o que faria no carnaval, e ele respondeu: Vou ler.

Essa resposta afirmada por ele eu nem preciso aprofundar, quem costuma ler o seu artigo aos domingos no Jornal O Estado do Maranhão, sabe que ele é um profundo conhecedor de história, principalmente do Maranhão pelo qual já escreveu diversos artigos a respeito, de todos os períodos que vai desde a fundação de São Luís aos dias atuais.

E há muitos que nem José Sarney se intitula historiador, o historiador Mário Meireles era amigo do José Sarney, quem já leu obras do Meireles sobre o Maranhão sabe que o mesmo tem o método de fazer as narrativas sobre a história do Maranhão, que é a busca de documentos oficiais, exaltar os heróis e apontar a relação da classe dominante com o estado, denominado de diálogo do poder, ou seja, o historiador oficial. O José Sarney tem o Mário Meireles como referencial em todos os artigos que escreve no jornal O Estado do Maranhão quando retrata a história do Maranhão.

É essa a razão de muitos não quererem a regulamentação da profissão de historiador, para que eles continuem escrevendo história, mas não queremos impedi-los. Apenas queremos demarcar o nosso espaço de direito, porque não é justo nós historiadores diplomados e de fato seja ofuscado por aqueles que julgam historiadores e nós diplomados seja apenas visto como “contador de história” e de forma pejorativa.

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