sexta-feira, agosto 5

O normal de sempre

Antes de eu acordar, quero dizer, antes de acordar a maioria das pessoas, ela já deve está de pé. Quando a vi pela primeira atrás do balcão percebi suas olheiras e a cara de sono, cara de quem deve ter dormido umas poucas horas, talvez três horas. Dei um bom dia a ela e ela me deu outro bastante forçado e grudento, talvez tenha esquecido de escovar os dentes, por que senti um hálito de quem não escovou.

As semanas foram passando e sua expressão estava bem melhor, não tinha mais aquela olheira e hálito, o sorriso era espontâneo e soube seu nome: Jardenia. Nome totalmente esquisito, diz que foi a mãe que deu. Vai saber de onde tirou esse nome.
Passou a me dar bom dia antes de eu dar bom dia.

Um dia, acho que era segunda feira, estava alegre demais para o normal de sempre. "O normal de sempre" era três pães massa grossa e dois massa fina. Disse que estava grávida de dois meses e gostaria de um filho homem e receberia o nome Jordoso, segundo ela, mulher dá muito trabalho. Agora estava explicado o sorriso mais largo. Talvez essa coisa de botar nome esquisito deve ser hereditário. Dei meus parabéns e ainda pensei em dizer que ia ser o padrinho, mas preferi ficar calado, vai ver que ela leva a brincadeira a sério. Um estudante que ainda depende dos pais pra pegar ônibus não deve ser padrinho de ninguém.

Passei um mês sem comprar pão, é que meus pais passaram um mês economizando para pagar a TV de 14 polegadas. Substituímos o pão por bolacha de água e sal.
Não sei o que aconteceu com Jardenia neste um mês, pois a encontrei cabisbaixa e muda, muito pior do que no primeiro dia. Não me deu bom dia e nem um sorrisinho, ao menos forçado. Sua barriga ainda continuava do mesmo tamanho e não falou mais de filho. Talvez alguém da família tenha morrido.

Os homens são covardes


Tive uma conversa com um amigo que esteve aqui em casa durante as férias. Contava sobre sua saúde e, especialmente, sobre um exame que iria fazer. Estava visivelmente com medo, sua testa suava e suas mãos pareciam inquietas. Imaginei de qual exame se tratava, seria o terrivél.... Vocês sabem!Como os homens são convardes. Evitei dizer a ele se conhecia o tal do Papa Nicolau ou melhor a mamografia, ou mais a tal da cólica todo mês, ou ainda a dilatação dos ossos pélvicos na hora no parto. Eita! Disse que não ia falar! Cala a boca, Cris!

Em outro dia recebo a visita de um outro conhecido(às vezes sou psicóloga ).Um cara casado, com um filhinho de 3 anos. Casou assim, vamos dizer... às pressas por um descuido. Dialogmos muito, sobre diferente tópicos de nossas vidas, até que chegamos no ponto de seu casamento. Assunto delicado! Senti uma grande tristeza naqueles olhos meio castranho esverdeados, um arrependimento, uma vontade de jogar tudo para cima e ser feliz. Feliz mesmo! Pois isto não conseguia perceber em seus olhos. Pobre de meu amigo! Pagando por um erro que cometeu.

Às vezes fico divagando sobre estes tipos de relacionamentos e coisas que os homens têm uma fobia de fazer. Quantas vezes estão presos em escritórios, usando sapatos, ternos , gravatas e outras tantas coisas que os prendem. Têm uma vida burocrática ou melhor burrocrática. Admiro aqueles que sabem a hora de dizer NÃO(é óbvio que isto não se aplica a todos os seres do sexo masculino), aqueles que sabem dizer SIM para a vida , aqueles que demonstram coragem, bravura diante da encruzilhada da vida. È engraçado como, os homens sempre estão associados a visão de músculos, de virilidade , de destemidos... Mas, na verdade são todos indefesos, inseguros e imaturos, uns covardes(alguns, hein gente!)

Encontrei um desses amigos, num dia desses e percebi nele um olhar de satisfação. Peguntei o que havia acontecido ele me respondeu: " Cris, sou agora dono do meu próprio negócio, percebeu minha barba grande?" Eu disse sim com um sorriso de satisfação por vê-lo feliz. Mas, algo ainda o incomodava. " Não sou ainda dono do meu coração " E eu disse "Por quê? " . "Ainda não conseguir me libertar daquele casamento de conveniência, ainda pago a conta do erro, minha dívida parece nunca acabar, mas um dia eu me liberto". Eu disse: " Claro que sim, meu amigo" . Mas eu pensei mais alto com as rosas que enfeitavam meu vestido. Os homens são de fato uns belos covardes.