quinta-feira, novembro 15

E nossa estória já começou com um ponto final



Então vamos logo pro próximo parágrafo e falar de como nos conhecemos, pois na primeira oração a flecha atravessou o peito escorrendo nosso sangue na ponta triangular e feroz.  Doeu saber que você ia embora numa espaçonave pra outro mundo. Por isso é tão urgente fazer esse filme.

A locadora. Sempre fui lá. Eu estava na sessão de dramas e você na sessão nacional. E por cimas das prateleiras nos olhamos e você não falou nada e eu também não apesar de que dizem que o olhar fala muita coisa. Vi o filme em suas mãos e você reparou também o filme em minhas mãos.

Não importa agora falar dos filmes nas mãos. O que importa é que estamos novamente na locadora e você agora na sessão de dramas e eu na sessão nacional e você com o último filme que eu tinha alugado e eu com seu filme nacional que daquele dia tinha visto em suas mãos. Coincidência demais. Um olhar e logo depois o sorriso ao mesmo tempo falamos - oi - e procuramos um verde por que falamos a mesma palavra ao mesmo tempo e rimos de novo e corremos atrás de um filme com uma capa com uma cor verde e tocamos quase derrubando os outro filmes como crianças da prateleira.

Descobrimos nossos nomes.

- te vejo na sessão de comedia romântica qualquer dia?

- Isso é uma cantada?

- Era uma pergunta.

- Você entendeu.

- E se fosse?

- Bem original. Seleção Oficial de Cannes.

Mais risos. Estava encabulado e você parecia no controle da cena. Um silêncio total. Um corte e entramos num ônibus sentadinhos no final dos bancos ao som de um funk de um celular de alguém sem fone nos ouvidos. Era nossa trilha sonora. Beijamos-nos. Talvez o clímax do filme, ninguém sabe. Mas foi muito bom saber que seu sabor era de maçã e eu de hortelã. Também estava mastigando um chiclete de hortelã nos bastidores e você comeu uma maçã no camarim. O pecado original. Íamos nos despir em frente um do outro. É a próxima cena que você descreveu naquele poema simbólico que rabiscou numa folha de guardanapo no dia que fizemos dois meses e me deu depois do sanduíche de frango.

 O rio correu pro mar
Na sua sina eterna
E fundiu-se fazendo
Um redemoinho de afogar desavisados
E o sol acordou da janela do quarto

Outro corte.  

Mais um abraço. Um silêncio. Estamos em pé se despedindo. Você na plataforma esperando a espaçonave pra outro mundo. Ainda bem que fizemos nosso filme. O ponto final está chegando. Sabemos que as lágrimas serão inevitáveis. Por mais que tentemos deixar o cristalino dos olhos brancos ele avermelhou como a ponta da flecha, mas com outra dor e caiu um chuvisco de sal.

- Thau.

- Thau.

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