terça-feira, maio 29

A Lambida


Ilustração de Diego 

Foi assim que a conheci: carente, precisando de companhia. E lá estava eu, na hora e no local certo. Foi uma espécie de amor a primeira vista, pelo menos assim queria eu entender, no entanto, sabia que seria muito difícil que ela gostar de mim, embora não fosse impossível - a realidade pode ser dura, mas tem seus caprichos, vez ou outra se maquia de sonhos para sair escondida...

“Vou tê-la pra mim”, disse convicto, mesmo que seja contra a sua vontade, mesmo que não ame, mesmo que não se agrade da idéia. Ela será minha, pois, tratando o meu amor como um fato concreto, não preciso de uma recíproca, uma vez que tudo que preciso já foi constatado. Portanto, empiricamente, em outros termos, mais cedo ou mais tarde, ela iria gostar de mim. Disso eu tinha certeza. Basta ela saber que eu sou o grande amor da vida dela. Se ainda não me ama é por façanha da ignorância. Coitada, ela não tem culpa...   
            

No começo, quando nos conhecemos, tínhamos somente um ao outro. Criamos intimidade. Com pouco tempo, já estava morando em sua casa. Precipitei-me em aceitar. Podia ficar cozinhando a situação a banho maria, mas resolvi colocar tudo no óleo quente. Decidimos ir muito rápido. Já invadia seu quarto. Já dormia e acordava em seus braços... Todavia, minha ópera não durou muito tempo. Apenas o suficiente para ela preencher aquele antigo vazio, que deixou de existir depois de um telefonema...

Ele ligou. Ela sorriu - claro era ele que falava!. Ele, gentilmente,  convidou-lhe para sair, para esquecer o passado, para recomeçar... Sorrindo o tempo todo, ela disse ‘não’ ainda duas vezes, em seguida aceitou com um “tá bom, às sete”. O destino é ingrato, por isso geralmente acaba em tragédia, mas não nesta história...
            
Eu ouvi toda aquela prosódia. Queria permanecer na ignorância. Descobrir a coisa aos poucos. Desconfiando de seus suspiros mais profundos. Achando, em seus olhares mais perdidos, o que me afastava da sua vista. Decidi conviver com isso. Com todas as forças, queria pensar que aquilo seria passageiro e que, depois, tudo se restabeleceria como era antes. No entanto, sabia que isso iria acontecer uma hora ou outra: ela acharia outro alguém com quem teria que dividir a atenção, e eu iria sofrer o pior abandono que existe, aquele que é feito quando alguém nos deixa para procurar prazer, e nós ficamos de mãos atadas na incapacidade de proporcionar outras saídas, já que a única disponível foi justamente aquela que foram procurar na rua...
            
Pensar no passado é o único paliativo. Na época, éramos tão felizes. Andávamos no parque. Passeávamos pelas calçadas altas horas da noite. Ela preparava minha comida, já que eu sempre fui uma negação na cozinha. Enfim, por que tudo chegou a esse ponto? Não sei ou talvez prefira não saber. Não há tempo para especulações. Sobretudo quando ela veio com ele para a nossa casa. Que absurdo! Sob as minhas fuças! Eu perdi o controle ao vê-lo. Gritei, falei um milhão de coisas, mas ela, no tom que eu jamais tinha escutado, mandou-me calar a boca. A que ponto cheguei... Restou-me permanecer no meu canto, calado, velando meu ódio em silêncio...
            
Nessa noite eles ainda foram cama. Ainda tentei dizer que estava doente e que precisava de cuidados, mas ela não deu atenção. Tentei entrar no quarto, mas ela fechou logo a porta e não disse sequer boa noite. Fui obrigado a escutar seus gemidos, que eu jurava serem só meus. Não há tortura pior, quanto mais quando não há uma arma por perto, para silenciar de vez o barulho ou vida. Mas tragédia mesmo seria quando ele retornasse mais e mais vezes. Quando eu deixasse de ser o dono da casa para ser somente um objeto. Mas isso não iria acontecer! Ela vai ser minha! Alías, ela já é minha. O problema é que não foi alfabetizada nestas circunstâncias, não sabendo ler o que digo em linhas expressas.

Naquela noite, tracei um plano. Era a cartada final. Esperei eles chegarem. Já estavam namorando e todos os finais de semana ele já ia para nossa casa para dormir e sujar nossa louça. Cretino. Esperei que ambos dormissem e observei atentamente se eles faziam amor ou não. Nessa noite não fizeram. Era a situação perfeita. A única chance. Deixavam a porta aberta, já que eu não protestava mais contra o que faziam. Mas era tudo proposital. A frieza do meu plano deixou meus sentimentos suspensos por hora. Entrei sorrateiramente no quarto. Subi na cama bem devagar. Invadindo a cama por debaixo dos lençóis. Me embrenhei pela sua camisola e, delicadamente, comecei a lamber sua vulva. Quando percebi que ela ficava úmida, lambia com mais vigor e mais velocidade, parando de propósito para que ela, com as mãos, afundasse minha cabeça em suas entranhas como se quisesse pôr-me para dentro do útero.

De repente a luz acendeu. Era ele, ao lado do interruptor. Eu ainda continuei, por cinismo, para ele sentir na pele o que é ser ignorado. Ela ainda se contorceu de prazer umas duas vezes antes de me empurrar de uma vez e dizer de veementemente: “Não é nada disso que você está pensando”. Ele só repetia “não acredito que você fez isso comigo, logo com ele!”. Eu pensava, por meu turno, “bem feito!”. Eles discutiram na minha frente. Ela tentava pedir desculpas, mas ele não se conformava. Ao mesmo tempo, percebia que ela me olhava com canto dos olhos. Era um olhar de cumplicidade, como se ainda pensasse no efeito da minha língua em seu clitóris. Ela tinha gostado. Eu sabia. O olhar denunciava. Ela não conseguia sequer construir seus argumentos, tão aturdida que estava. Também pudera. Jamais imaginaria que eu tivesse tal ousadia e depois, tal habilidade. Seus pensamentos estavam confusos e suas desculpas eram um ato mecânico depois de ouvida a acusação.

- Não acredito que você me traiu com um cachorro desses!

Foi que ele disse antes de bater a porta. Furioso como um bicho. Eu queria rir, cantar vitória. Mas não queria que a situação se tornasse mais constrangedora do que já estava. Poderia sobrar para o meu lado. Esperei que ela tomasse a primeira atitude. Me fiz de sonso. Ela passou por mim, sem dizer uma palavra. Talvez fosse chorar. Pensei mesmo que ia dormir. Mas quando ela entrou no quarto, assoviou e estalou os dedos. Respondi prontamente com um latido. Desde então dormimos juntos.

2 comentários:

Unknown disse...

a lambida na buceta que rompe qualquer epistemologia...rs

dieguito

Igor Café disse...

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