sexta-feira, junho 29

EPISÓDIO 4 - Soco Inglês



Graças a isso, Luisinho conseguiu virar-se a tempo de desviar-se do golpe traiçoeiro do agressor, abaixar-se e dar-lhe um soco na boca do estômago, o agressor imediatamente se recurvou, sem ar, Luisinho não perdeu tempo e lhe mandou mais um soco, no queixo, um gancho vindo velozmente de baixo, que foi a deixa para um verdadeiro combo, o agressor cai de joelhos, Luisinho o pega pelo colarinho, e daí uma enxurrada de socos metálicos e perguntas retóricas, “quem é viado agora, féla da puta, hem?, fala, caraleo, perdeu a língua?”, etc, começam a chover na cara do agressor subitamente colocado na posição de agredido, de invadido pelo ódio e pela ira de se ver derrubado por um dos seus melhores comparsas.

– Viado, sim, mas na dele, gente boa, e errado todo, deixa ele entrar pra galera pra ver como ele se comporta, foi isso que o agressor havia dito aos outros da gangue quando conheceu Luisinho, e agora o agressor tinha que engolir a humilhação de estar levando uma surra de um cara que um dia foi seu amigo mas que agora não passava de um viado escroto féla da puta defendendo uma bichinha fuleira, e dominando tudo, lá no fundo daquele psicológico cada vez mais e mais em frangalhos, um sentimento que era familiar ao agressor, mas o qual ele trancava numa sala cuja porta ele evitava abrir, só que agora esse sentimento se revoltava, retorcia-se nos seus grilhões, espancava a porta da cela em que jazia aprisionado e fazia chegar seu nome aos ouvidos do agressor, MEDO, MEDO, MEDO, o mesmo medo que o fazia viver sua vida agredindo e odiando a tudo e a todos, o mesmo medo que, desde que a briga havia começado, estava fazendo cócegas nos amigos do agressor, que olhavam tudo sem saber o que fazer, nenhum deles na verdade queria confusão, estavam realmente com medo de que, por qualquer coisinha, eles fossem mandados para a Febem, medo infundado, já que porra de Febem nem existe mais, mas foi para lá que disseram haver mandado o moleque que havia dado uma pedrada no outro.

– E ninguém nunca mais viu nem sombra do Pedreiro, diziam os estudantes, que é como o rapaz que havia dado a pedrada no outro ficou conhecido depois, além do mais a escola estava visada, essa história da pedrada havia sido péssima para a imagem da educação pública estadual, imaginem as manchetes sensacionalistas dos jornais das oposições coligadas, Garoto Morre Apedrejado Em Escola Estadual, foi horrível, até porque o garoto nem havia morrido apedrejado, ele havia levado uma pedrada só, bem no meio da cabeça. Certeira? Fatal? Seja! Mas havia sido uma só, mesmo assim, o diretor estava decidido a evitar que cousas dessas se repetissem, e já havia começado a implantar medidas e baixar decretos severíssimos, alterando normas e estatutos de alto a baixo em nome da segurança escolar, por isso, os bandidinhos do colégio estavam, como já havíamos dito, com as barbas de molho, mas a indignação e a revolta de ver seu líder levando um piau de um viado acabou tirando os caras da trincheira e da letargia, só que aí, no momento em que eles decolavam do muro para ir tomar satisfações com Luisinho, isto é, partir-lhe a cara como ele havia feito com o seu líder, moer-lhe de pancadas como se ele fosse um cão sarnento, uma viatura da polícia apareceu do nada, coisa impressionante, liguem para o 190 e peçam uma viatura para ver o tempão que ela leva para aparecer, quando aparece.
– E vem aparecer uma bem na hora que neguinho ia baixar o cacete naquele viado escroto – era assim que um dos comparsas do agressor iniciaria, horas depois, o parágrafo final de sua narração sobre o episódio.
­– Eu estava lá e tenho certeza que foi a minha prática do sonen, que eu comecei a fazer na hora que a briga começou, que fez a polícia aparecer tão rápido – era assim que explicava aquela presta aparição policial uma jovem nerd que freqüentava a igreja messiânica, fazer o quê, no Brasil tem coisas que só o sobrenatural pode explicar. Os policiais desceram da viatura, eram três, e, imediatamente, partiram pra cima de Luisinho, de revólver em punho, zurrando aquelas pérolas típicas do jargão policial.
– De frente pra viatura!
– Mão na cabeça vagabundo!

CONTINUA...

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