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sexta-feira, julho 6

EPISÓDIO FINAL - Soco Inglês



Luisinho não pôde evitar de ficar meio excitado na hora da revista com aquele policial tesudo lhe apalpando a bunda, lhe enfiando a mão na virilha, ele poderia até jurar que, por um instante, o policial lhe havia apertado com gosto a rôla por trás, que diabo de fetiche louco é esse que toda bicha tem com os homens ditos da lei:
– Desculpe, senhor policial, eu estava dirigindo rápido demais? Oh, será que o senhor poderia me punir de outra maneira, sem ser com multa?
Luisinho estava pensando nessas coisas enquanto o policial terminava a revista, e quase chegou a rir de seus pensamentos obscenos, mas se controlou a fim de não irritar os “homi”, é o povo brasileiro realizando o plural à italiana, depois os policiais o algemaram e o levaram preso, enquanto uma ambulância recolhia o que havia restado do agressor agredido sobre o chão de piçarra tornado ainda mais vermelho pelo sangue derramado e que ainda manchava parte da calçada na segunda-feira seguinte, quando quem não havia ido ao colégio na sexta, ou havia ido embora antes de o pau cantar, teve que se contentar em ouvir, seja abismado, boquiaberto, de queixo caído, se hetero, seja falando coisas tipo “jura?”, “minina, não me conta!”, “que babado!”, “tô boba!”, “tô passada!”, “tô bege indo pra mostarda!”, se gay feliz em sê-lo, o relato das testemunhas oculares, como o da menina messiânica, que depois queria até fazer um johrei em Luisinho, mas não teve coragem de se aproximar dele, que, como consequência da prisão, apenas havia levado uma bronca do delegado de menores, nem o soco inglês ele perdeu, pois o pai de Luisinho, que havia chegado à cidade na manhã de sexta-feira para passar o fim-de-semana, fez um acordo com o pai do agressor agredido.

sexta-feira, junho 29

EPISÓDIO 4 - Soco Inglês



Graças a isso, Luisinho conseguiu virar-se a tempo de desviar-se do golpe traiçoeiro do agressor, abaixar-se e dar-lhe um soco na boca do estômago, o agressor imediatamente se recurvou, sem ar, Luisinho não perdeu tempo e lhe mandou mais um soco, no queixo, um gancho vindo velozmente de baixo, que foi a deixa para um verdadeiro combo, o agressor cai de joelhos, Luisinho o pega pelo colarinho, e daí uma enxurrada de socos metálicos e perguntas retóricas, “quem é viado agora, féla da puta, hem?, fala, caraleo, perdeu a língua?”, etc, começam a chover na cara do agressor subitamente colocado na posição de agredido, de invadido pelo ódio e pela ira de se ver derrubado por um dos seus melhores comparsas.

– Viado, sim, mas na dele, gente boa, e errado todo, deixa ele entrar pra galera pra ver como ele se comporta, foi isso que o agressor havia dito aos outros da gangue quando conheceu Luisinho, e agora o agressor tinha que engolir a humilhação de estar levando uma surra de um cara que um dia foi seu amigo mas que agora não passava de um viado escroto féla da puta defendendo uma bichinha fuleira, e dominando tudo, lá no fundo daquele psicológico cada vez mais e mais em frangalhos, um sentimento que era familiar ao agressor, mas o qual ele trancava numa sala cuja porta ele evitava abrir, só que agora esse sentimento se revoltava, retorcia-se nos seus grilhões, espancava a porta da cela em que jazia aprisionado e fazia chegar seu nome aos ouvidos do agressor, MEDO, MEDO, MEDO, o mesmo medo que o fazia viver sua vida agredindo e odiando a tudo e a todos, o mesmo medo que, desde que a briga havia começado, estava fazendo cócegas nos amigos do agressor, que olhavam tudo sem saber o que fazer, nenhum deles na verdade queria confusão, estavam realmente com medo de que, por qualquer coisinha, eles fossem mandados para a Febem, medo infundado, já que porra de Febem nem existe mais, mas foi para lá que disseram haver mandado o moleque que havia dado uma pedrada no outro.

sábado, junho 23

Soco Inglês- 3 episódio



– Devagar com o andor, caros leitores, o já imensamente aguardado encontro entre Adenílson e seu agressor está para acontecer, pois Adenílson já cruzou o portão do colégio e, ato contínuo, o agressor partiu em sua direção, enquanto Luisinho comia prosaicamente uma batata-frita numa barraca em frente ao colégio, junto ao mesmo muro de onde o agressor havia se descolado com sangue nos olhos rumo a Adenílson, feito águia que viu, sei lá, o preá, inventem aí vocês uma metáfora conveniente, o fato é que o agressor atravessou a rua correndo em direção a Adenílson, que, em vez de fugir, deu uma de mocinha-peituda-de-filme-de-terror-que-vê-o-assassino-psicopata-surgir-do-nada-de-facão-em-punho-bem-na-frente-dela, estacou o passo e ficou lá, parado, imóvel, gritando por socorro, mas baixinho, em pensamento, a vergonha falava mais alto que o medo, as mocinhas peitudas de filme de terror não têm desses pudores, gritam mesmo e pronto, não têm vergonha de dar xilique diante de milhões de telespectadores, essa mesma vergonha que, combinada com o medo, fez Adenílson ficar caladinho e criar raiz onde ele estava, vendo, em câmera-lenta, o agressor se aproximando rapidamente.

sexta-feira, junho 15

Soco Inglês - EPISÓDIO 2



O que se seguiu foi cena de filme: Adenílson estava se levantando quando o rapaz cerrou o punho direito, e o murro só não pegou em Adenílson porque Luisinho, que estava ali do lado, vendo tudo, segurou, num reflexo involuntário, o punho armado do outro rapaz, dizendo, num tom amigável:
– Ê,rapá, melhor tu deixar esse novato em paz.
– Koé, tá vacilando, mané?, respondeu o outro, dando uma de homem, e, por um instante, os dois parceiros de tantas pirações, subitamente colocados em posição de antagonistas, ficaram se medindo, uma mão que agredia contendo outra mão que agredia e que estava a fim de agredir muito. Luisinho então falou, sério:
– Chegado, se tu bater nesse verme, tu vai te dar mais mal que ele, caralho, tu viu o que aconteceu com aquele outro depois que ele deu uma pedrada no muleque lá, tá pagando febem até hoje.

sexta-feira, junho 8

O soco inglês - EPISÓDIO 1




Os pais de Luisinho ficaram chocados quando receberam uma carta da alta direção do colégio de freiras missionárias capuchinhas onde seu filho de dezesseis anos cursava a oitava série do antigo ginásio, dando conta de que o jovem estava “sumariamente expulso da escola por haver atentado violentamente contra o pudor moral, em associação pederástica com outro aluno, com quem havia sido pego mantendo prática de sodomia nas sacrossantas catacumbas que guardam os restos mortais das saudosas pioneiras fundadoras desta casa”. A mãe deu um pití e o pai sumiu de casa por um mês. Porém, a família era rica, e dispunha de uísque e barbiturícos, no caso da mãe, e carros, mulheres e cerveja, no caso do pai, o suficiente para lidar com esse tipo de crise. Nascido de pais ricos, Luisinho nunca soube, ou antes, nunca precisou saber o que é passar necessidade. Filho único, ele sempre teve tudo a tempo e a hora, graças à fortuna que seu pai construiu, sabe-se lá com que grau de licitude, como pecuarista. Porém, não tinha nada de menino mimado, ou de enfant térrible, como era de se esperar sendo ele filho de pais que eram mais imaturos que ele. Sempre havia sido uma criança quieta, que vivia brincando sozinho com esquisitos jogos de tabuleiro e livros cheios de histórias fantásticas acompanhadas de ilustrações belas e assustadoras.

sexta-feira, junho 1

eXpurGo - Último Episódio


Logo a blazer aparece, estaciona, os Outros descem dela e se dirigem ao banheiro, foi aí que Miguel disparou uma primeira rajada de uzi, traiçoeira, pelas costas, derrubando logo três de uma vez, o chefe da matilha entre eles. O azarão que escapou da fúria balística de Miguel entrou no banheiro, e, logo em seguida, Miguel pôde ouvir dois disparos, após o quê, silêncio total. Miguel saiu cuidadosamente de trás do carro, dirigindo-se ao banheiro, mas, no caminho, não pôde evitar de descarregar mais uma rajada de balas em cada colhão de policial tombado que viu pela frente, e não venham inferir desse pela frente que o policial que caiu de bruços escapou de ter seus ovos estraçalhados pelo chumbo grosso, pois Miguel o virou de costas com o pé.

sexta-feira, maio 25

eXpurGo - Episódio 4


– E por que eu tenho que ajudar você?
– Pra se redimir de ter ficado calado enquanto surravam um amigo seu.
– Você foi muito mais que um amigo para mim.
– Isso não melhora as coisas pra você, até porque, durante todo o tempo em que estivemos juntos, você nunca me disse nada do gênero, mas eu entendo, entendo perfeitamente, você tinha vergonha de admitir que me amava, mas vamos deixar de sessão nostalgia e me dá logo esse berro.

sexta-feira, maio 18

eXpurGo - EPISÓDIO 3

Égido não pôde evitar que uma lágrima espelhasse nos seus olhos a lembrança contida de um passado remoto, e Miguel nem cogitaria a hipótese de não ver naquele olhar o seu próprio reflexo deitado na praia ao lado de quem ele, àquela época distante, cria ser pateticamente o grande amor de sua vida. Uma reminiscência doce, vermelha e amarga de amantes ordinários e safados que se amaram no anoitecer de uma foda na areia com o mar acariciando seus pés, mas quem pensa que aquela noite ébria na praia, que me perdoem o clichê poético da frase anterior, foi uma noite metaforicamente romântica, hum!, digo-lhe que ela foi mesmo é euforicamente libertina. Detrás de uma pedra, sob a luz tênue de um holofote distante, de frente um para o outro, detrás de todos, duas pernas de não sei quem se levantaram, realmente não deu pra ver de quem eram devido à espessa penumbra e ao fato de este narrador não ser Deus...

sexta-feira, maio 11

eXpurGo - EPISÓDIO 2


– Pois é, respondeu o soldado Égido, não podendo evitar que um começo de lágrima lhe umedecesse os olhos. Miguel, vendo aquele olhar, disse:
– Valeu a pena levar essa surra só pra ver esse seu olhar de pena, disse Miguel.
– Você gosta que as pessoas sintam pena de você?
– Caralho, mesmo tendo largado o curso de psicologia – Miguel tosse e cospe mais sangue – mesmo tendo largado a porra da psicologia, você não perdeu essa mania de analisar os outros e essa incapacidade de se analisar a si mesmo, o que eu disse não tem nada a ver com as pessoas, mas com você, eu quis dizer que, se você ainda é capaz de sentir pena, é porque ainda é capaz de sentir alguma coisa boa, exatamente como o menino gentil e cordato que eu conheci e que tanto amei, ou seja, você ainda é capaz de amar, mas confesso que estou um pouco chocado – nova pausa para mais tosse e mais sangue cuspido – de ver aquele que eu pateticamente cria ser o amor da minha vida espancando seres humanos como meio de vida.

sexta-feira, maio 4

eXpurGo - Episódio 1


No começo, tudo era como uma brincadeira, fumar um cigarrinho proibido, no fim da tarde, no banheiro daquele prédio abandonado lá nos confins do campus, mas a brincadeira acabou ficando pesada demais. Depois que Miguel fez aquela observação degustatória acerca do sabor daquela maconha, “hum, essa diamba tá com um gosto diferente...”, ele nem teve tempo de apreciar as belas estrelas que surgiram na sua frente como conseqüência do violento tapa, traiçoeiro, pelas costas, que ele havia acabado de levar na face direita, porque se viu imediatamente agarrado e atirado contra a parede por um bando de policiais militares, enquanto seu namorado fugia pelo basculante quebrado de uma janela do banheiro, sem olhar para trás, com o que perdeu de ver aquele que ele cria pateticamente ser seu grande amor ser moído de pancadas por três dos polícias, enquanto um quarto revistava a sua mochila, revista após a qual sua situação pirou muito, pois, durante a mesma, o dito pê-eme encontrou, na mochila de Miguel, uma substancial quantidade de maconha, além de uma outra revista, esta, de homem pelado.

terça-feira, abril 24

Atropelamento

Personagens
MIGUEL
VELHO ATROPELADO, personagem mudo (ou antes, plangente)
FILHO DO VELHO
FILHA DO VELHO
MULTIDÃO ENFURECIDA
TESTEMUNHA
POLICIAL
Antes de subir o pano, ouve-se o barulho de pneus cantando e de um corpo se chocando contra um veículo. Quando o pano se abre, vê-se uma multidão aglomerada em semi-círculo, de frente para a plateia, ao redor de um Velho caído no chão, sangrando e gemendo. Da multidão vêm gritos de “Ai, meu deus” e similares. O filho do Velho se agacha próximo ao pai para socorrê-lo, mas é impedido por Miguel, que se mete entre os dois.

domingo, abril 22

Colegas de Foda

Hey now!
All you sinners!
Put your lights on! Put your lights on!
Hey now!
All you lovers!
Put your lights on! Put your lights on!
Miguel e Carlinhos tinham se conhecido através de amigos comuns, numa roda de cerveja, vendo futebol. Miguel era vascaíno e gay assumido, Carlinhos, flamenguista e raparigueiro profissional. Miguel, na verdade, nem gostava muito de futebol, mas gostava de homem, e homem macho, desses que cospem no chão e coçam o saco com ar de cafajeste, e que lugar melhor para encontrar desses espécimes, hoje em dia infelizmente nada raros, que numa roda de cerveja, vendo futebol? Normalmente, Miguel não buscava ali mais que sexo causal e fortuito, mas, naquele dia, foi diferente. Miguel se apaixonou por Carlinhos assim que o viu. Carlinhos, apesar de ser machista, não era homófoba, e, com o tempo, os dois acabaram cultivando uma amizade cheia de companheirismo e afetividade, que deixava o resto da turma desconfiada da heterossexualidade de Carlinhos. Mas ele não se importava, não iria deixar uma amizade tão bacana que nem aquela se acabar por causa de intriga da oposição, como ele dizia, de modo que, com o tempo, os dois viraram unha e carne um do outro. Porém, essa amizade causava muito sofrimento a Miguel, principalmente quando ele tinha que ouvir as confidências de Carlinhos sobre suas conquistas com as mulheres, tudo porque Miguel continuava amando pateticamente Carlinhos. Para Miguel, aquele era o homem de sua vida.
Uma noite, os dois tinham derrubado sozinhos uma garrafa de uísque num bar, e saíram de carro para um outro bar, num movimento bem conhecido da geração risca-faca. O rádio do carro estava ligado baixinho. Começou a tocar "You're My Number One", com Enrique Iglesias e Sandy & Junior.
I've kissed the moon a million times...
Danced with angels in the sky...
No caminho, Carlinhos, que vinha dirigindo, encostou o carro, e disse, puxando o freio de mão:
- Cara, eu tô com uns problemas aí...
- Sério, cara? Quê que é?
- É minha mina... Ela me disse que... eu não faço ela gozar...
- Hum, fez Miguel. Há quanto tempo?
- O quê?
- Há quanto tempo ela não goza contigo, ela disse?
- Disse, essa vaca... Diz que faz uns seis meses.
- Seis meses!!! Caralho... Mas tu não chupa ela não? Me disseram que com mulher é assim, é melhor o cara dar logo o orgasmo dela – porque, agora, elas querem gozar – antes mesmo de largar pau nela. É como diz aquela música, "you gotta lick it, before you stick it", tem que chupar antes de meter, "bará-rará-ra-bum!! Bará-rará-ra-bum"!
- Rapá, eu chupava, mas ela não gostava de retribuir... Aí é foda...
- E aí tu simplesmente parou?
- Foi...
You bring me up when I'm' feeling down...
You touch me deep, you touch me right...
- Deixa eu te dizer uma coisa sobre as rachas: nenhuma delas, a não ser se for puta, chupa pau direito. Ou, pelo menos, não tão bem quanto um viado. Parece que elas têm nojo, sei lá...
- Pode crer, as poucas vezes que ela me chupou, ela fez mal e porcamente, parecia mesmo que ela tava era com nojo, sei lá!
Troquei mistérios no amanhecer...
Entre os anjos e você...
- Mas aí é que tu devia ter entrado e conversado com ela a respeito. Ah, mas eu esqueci, vocês tão numa relação heterossexual judaico-cristã, onde o conveniente é manter tudo envolto num manto de silêncio e segredos.
- Tu é foda. Eu já conheço esse teu discurso. Mas tu acha que eu não sei que minha mina quer gozar também? Eu posso não ter falado nesse assunto, mas eu me dedicava pra caralho pra dar prazer pra ela, mesmo eu já tando a fim de leitar, eu ficava lá, me segurando, pra ver se dava pra ela esse tal de orgasmo, e ela vem e me diz que não adiantou nada? Foda-se. Passei a meter nela sem dó nem consideração pelos sentimentos dela, só usando o corpo dela pra gozar.
- Como se tu tivesse só te masturbando com o corpo dela...
- Isso.
You bring me up when I'm' feeling down...
You touch me deep, you touch me right...
- Bom, o que eu posso te dizer é que, se eu tivesse no lugar dessa racha, eu ia te chupar pra caralho, mano. Ia ficar horas babando nesse teu cacete, engolindo ele todinho, e esfregando minha língua pelo corpo da tua rola, de cima a baixo, enquanto ela ia se agasalhando na minha boca e beijando minha goela com a boquinha da cabecinha...
You make me wicked, you make me wild...
- Que porra é essa, Miguel?
- Ainda não acabei. Depois que teu caralho tivesse molhadão com a minha baba, eu ia ficar socando uma punheta irada nele enquanto lambia e engolia tuas bolas, primeiro uma, depois a outra, e, finalmente, engolia as duas ao mesmo tempo, sem parar de te punhetar gostoso...
Apesar da música, que ia terminando, um silêncio ia se impondo no carro depois dessa pérola da retórica pornográfica de Miguel, mas Carlinhos interrompeu esse silêncio, dizendo, meio envergonhado, meio excitado:
- Caralho... Fiquei de pau duro aqui. Ninguém nunca me chupou assim...
You bring me up when I'm' feeling down...
You touch me deep, you touch me right...
- Isso não me surpreende. Coisa mais sem graça deve ser uma foda de héteros...
- É agora, Miguel!
- Agora o quê?
- Eu quero experimentar essa parada. Dá cá um beição aqui, porra...
Carlinhos puxou a cabeça de Miguel de encontro à sua, mas este resistiu e recuou, dizendo:
- Nada a ver. Isso entre nós não pode rolar. Não desse jeito.
'Cause, baby, you're my number one...
Miguel, apesar de ser bicha safada, era extremamente romântico. Na sua cabeça, ele tinha idealizado esse momento com todas as cores ilusórias das letras das músicas estilo "house" da cultura gay pop – e, diga-se de passagem que é contraditório que músicas cujas letras falam de amor sejam feitas especificamente para serem tocadas em dark-rooms, onde o que o impera é a total ausência de qualquer sentimento mais nobre – e teria sido inadmissível para ele permitir que o seu sonho de estar com Carlinhos se concretizasse daquela maneira suja e escrota, no desconforto de um carro, no perigo de uma rua escura, trazendo, no dia seguinte, todas as conseqüências desagradáveis que seguem um ato cometido por impulso, no meio da embriaguez do uísque. E ainda mais com Sandy & Junior de fundo. Por causa dessa filosófica contradição dos termos, ele se negou a beijá-lo.
- Deixa quieto, doido, disse Miguel.
'Cause, baby, you're my number one...
Carlinhos, porém, não estava a fim de deixar quieto. Ele pegou Miguel à força e tascou-lhe um beijo desesperado na boca. Miguel resistiu no começo, tentou escapar, mas Carlinhos era mais forte que ele, e Miguel acabou desistindo e se deixando beijar. Mas, coisa estranha: à medida que Carlinhos o beijava, Miguel ia sentindo uma espécie de incômodo, não com os braços musculosos que lhe apertavam, ou com o barba mal-feita que lhe machucava a face, mas com a boca que lhe beijava de maneira tão desastrada, lambuzando, com uma língua muito mais humidecida de saliva que o aconselhável, a parte externa dos lábios e, erro fatal, chegando mesmo a ultrapassar sua fronteira, deixando no bigode ralo de Miguel um rastro de cheiro nojento de baba que imediatamente subiu às narinas de Miguel e lhe fez ter vontade de vomitar. Se não tivesse bebido tanto, talvez Miguel tivesse sido capaz de segurar o vômito, mas não foi o caso. Ele se soltou de Carlinhos num movimento brusco, abriu a porta e começou a chamar raul sem a menor cerimônia.
No rádio, começou a tocar "November Rain", do Guns'n'Roses. Fazer o quê, programação da madrugada é assim, só lentinhas pra machucar os corações apaixonados. Ainda mais quando eles estão vomitando a paixão.
When I look into your eyes
I can see a love restrained...
Quando Miguel acabou de vomitar, uns dois minutos depois, todo suado, Carlinhos olhava para ele, atônito.
       So if you want to love me

             Then darlin' don't refrain...
- Quer dizer que eu te dou nojo?, perguntou Carlinhos, com um sorriso nervoso, depois de um longo silêncio.
- Não é nada disso, disse Miguel, ofegando. Me dá uma balinha de menta aê, fera...
Sometimes I need some time...on my own
Sometimes I need some time...all alone
Uhhhh, everybody needs some time...on their own
Uhhhh, don't you know you need some time...all alone
- Tem um halls aqui, peraê...
- Valeu... Cara, o problema é que..., disse Miguel, pondo a bala na boca.
- É que o quê?
- É que...
- Fala logo, caralho!
- Tu beija mal.
- O quê!?
- É, tu beija mal. Mas isso, na verdade, é bom. Eu tava apaixonado por ti, por isso não queria fuder contigo dessa forma, digamos, improvisada. Mas teu beijo meio que me fez desapaixonar de ti.
- E isso é bom porque...?
- Porque, agora que tu não é mais o amor da minha vida, eu posso fuder contigo em qualquer lugar, em qualquer situação. Na verdade, agora, quanto mais escroto o lugar e a situação, mais tesão eu vou ter e mais prazer eu vou te dar.
And when your fears subside
And shadows still remain, uhhhh, yeah!
I know that you can love me
When there's no one left to blay-yayhhh
So never mind the darkness
We still can find a way
'Cause nothin' lasts forever,
Even cold November rain
- Ah, é?, disse Carlinhos, depois de outro longo silêncio.
- É, respondeu Miguel.
No rádio, "November Rain" entrava naquela parte final, em que as guitarras, os teclados e a percussão adquirem um andamento furioso.
- Tem um aterro sanitário bem ali, disse Carlinhos, num tom de quem sugere algo assim como quem não quer nada.
- Toca pra lá, disse Miguel, decidido.
Na manhã seguinte, um urubu, esta criatura pavorosa que é como o mendigo das aves de rapina, rastreando o aterro sanitário em busca de um café da manhã, teve seu paladar inusitadamente refinado pelo férreo sabor de um líquido leitoso, que, com montanhas de lixo por testemunhas e a aurora rubra por juiz, tinha sido cuspido da boca de Miguel, alguns minutos antes, em cima do pedaço de carniça que a ave de rapina ora degustava, depois de ter sido depositado naquela aconchegante conjuração de lábios e maxilares em abundantes jatos expelidos do falo latejante de Carlinhos...