O que se seguiu foi cena
de filme: Adenílson estava se levantando quando o rapaz cerrou o punho direito,
e o murro só não pegou em Adenílson porque Luisinho, que estava ali do lado,
vendo tudo, segurou, num reflexo involuntário, o punho armado do outro rapaz,
dizendo, num tom amigável:
– Ê,rapá, melhor tu deixar
esse novato em paz.
– Koé, tá vacilando,
mané?, respondeu o outro, dando uma de homem, e, por um instante, os dois
parceiros de tantas pirações, subitamente colocados em posição de antagonistas,
ficaram se medindo, uma mão que agredia contendo outra mão que agredia e que
estava a fim de agredir muito. Luisinho então falou, sério:
– Chegado, se tu bater
nesse verme, tu vai te dar mais mal que ele, caralho, tu viu o que aconteceu
com aquele outro depois que ele deu uma pedrada no muleque lá, tá pagando febem
até hoje.
– Tu vai ver na hora da
saída! Após dizer isso, o rapaz foi saindo do pátio, tirando a camisa molhada e
pondo-se a torcê-la para retirar o excesso de líquido.
– Ô, Luisinho, tu não vem
com a gente, perguntou outro rapaz enquanto a gangue se afastava.
– Já tô indo, respondeu
Luisinho, que seguiu os outros lançando um olhar e fazendo um gesto com a mão para
Adenílson como quem diz, “fica frio”.
Na hora da saída, o
agressor estava encostado no muro em frente ao colégio, rodeado pelos
companheiros de vacuidade, todos fumando cigarro mistral, quando Adenílson
cruzou o portão do colégio em direção à rua. Se ele, como Luisinho, houvesse
lido “O Senhor dos Anéis”, ele poderia haver dito que, naquele momento, ele
estava se sentindo exatamente como Frodo quando este adentrou as Minas de Moriá
com a Comitiva do Anel. Aos leitores que também não leram a célebre trilogia de
J.R.R. Tolkien, pedimos que tenham por favor a gentileza de poupar ao narrador
a descrição do pânico que tomava conta de Adeníson naquele instante, e
busquem-na às páginas daquela excelente obra, tendo o cuidado de ter em mente,
se vierem mesmo a realizar tal leitura, que o nosso Adenílson, ao contrário
dos hobbits de Tolkien, não tinha um
mago poderosíssimo lhe acompanhando de cajado-lanterna em riste para lhe
mostrar o caminho, enfim, por ora, tudo o que conseguimos dizer, para ilustrar
o caso com uma expressão popular, tão comuns nesse relato, e tentando, com os
parcos recursos da escrita, reproduzir o tom apropriado com que isso seria
dito, que “Adenílson?!, hum!, Adenílson tremia mais que vara verde, gente!”. Ele
mal podia conter o vômito que, se saísse, iria revelar que ele bravamente havia
segurado a coxinha junto de si ao cair em cima do rapaz, quando do incidente na
hora do recreio, e depois havia, sim, comido a coxinha toda, mesmo sob o
estresse e o trauma da agressão verbal e da ameaça de agressão física trazida com
aquele veredito que ecoava na cabeça daquele verme de deus, “tu vai ver na hora
da saída”, “tu vai ver na hora da saída”, “tu vai ver na hora da saída”, a cada
mastigada, a cada engolida a seco, e a cada golada de água do bebedouro pra
desembuchar depois, já que, como se sabe, o refrigerante havia se esparramado
todo sobre a camiseta do rapaz, deixando-a toda molhadinha e permitindo aos que
o rodeavam entrever, por baixo do tecido tornado transparente pelo líquido ali
derramado, as protuberâncias de seus mamilos tesos de pit-bull marombeiro
sarado. Agora, Adenílson vinha descendo o caminho que dava para a saída do colégio,
tremendo mais que vara verde, já havia visto de longe o seu agressor, que
estava encostado no muro em frente à saída da escola, rodeado pelos amigos,
todos com atitudes ameaçadoras enquanto fumavam seus cigarros mistraga, o
agressor estava com um pé encostado no muro, e, com a mão que não segurava o
cigarro, segurava displicentemente o caralho por cima do moletom, e, mesmo com
tanto terror se apoderando dele a cada passo que dava em direção à saída,
Adenílson não pôde evitar de ficar com o pênis em estado de semi-ereção diante
daquela visão, havendo até uma gota de esperma manchado sua cueca, afinal de
contas, o agressor era um “puta macho gostoso do caráleo!”, e a psicologia está
aí pra explicar, ou não, esses lances malucos de atração sexual, simpatia
sentimental, identificação ideológica, síndrome de estocolmo, o raio que o
parta, que rolam entre agredido e agressor, mais uma vez queiram os leitores
poupar o narrador de se deter em miudezas psicológicas que iriam entravar ainda
mais um relato já muito entrevado pelos insistentes comentários intromissivos e
impertinentes dessa bicha faladeira que é esse narrador.
– Fala sério, o cara não
continua a história, vou já parar de ler essa porra e ir tomar um café...
Então vai lá, a gente CONTINUA na semana que vem...
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