sexta-feira, junho 15

Soco Inglês - EPISÓDIO 2



O que se seguiu foi cena de filme: Adenílson estava se levantando quando o rapaz cerrou o punho direito, e o murro só não pegou em Adenílson porque Luisinho, que estava ali do lado, vendo tudo, segurou, num reflexo involuntário, o punho armado do outro rapaz, dizendo, num tom amigável:
– Ê,rapá, melhor tu deixar esse novato em paz.
– Koé, tá vacilando, mané?, respondeu o outro, dando uma de homem, e, por um instante, os dois parceiros de tantas pirações, subitamente colocados em posição de antagonistas, ficaram se medindo, uma mão que agredia contendo outra mão que agredia e que estava a fim de agredir muito. Luisinho então falou, sério:
– Chegado, se tu bater nesse verme, tu vai te dar mais mal que ele, caralho, tu viu o que aconteceu com aquele outro depois que ele deu uma pedrada no muleque lá, tá pagando febem até hoje.
O argumento, apesar de não expressar os verdadeiros motivos da intervenção de Luisinho, os quais os leitores deverão conhecer nas próximas páginas, fez efeito. O rapaz relaxou os músculos e saiu lançando sobre Adenílson o anátema mais temido pelos nerds e excluídos em geral que vivem sendo oprimidos pelos fortões da escola:
– Tu vai ver na hora da saída! Após dizer isso, o rapaz foi saindo do pátio, tirando a camisa molhada e pondo-se a torcê-la para retirar o excesso de líquido.
– Ô, Luisinho, tu não vem com a gente, perguntou outro rapaz enquanto a gangue se afastava.
– Já tô indo, respondeu Luisinho, que seguiu os outros lançando um olhar e fazendo um gesto com a mão para Adenílson como quem diz, “fica frio”.
Na hora da saída, o agressor estava encostado no muro em frente ao colégio, rodeado pelos companheiros de vacuidade, todos fumando cigarro mistral, quando Adenílson cruzou o portão do colégio em direção à rua. Se ele, como Luisinho, houvesse lido “O Senhor dos Anéis”, ele poderia haver dito que, naquele momento, ele estava se sentindo exatamente como Frodo quando este adentrou as Minas de Moriá com a Comitiva do Anel. Aos leitores que também não leram a célebre trilogia de J.R.R. Tolkien, pedimos que tenham por favor a gentileza de poupar ao narrador a descrição do pânico que tomava conta de Adeníson naquele instante, e busquem-na às páginas daquela excelente obra, tendo o cuidado de ter em mente, se vierem mesmo a realizar tal leitura, que o nosso Adenílson, ao contrário dos  hobbits de Tolkien, não tinha um mago poderosíssimo lhe acompanhando de cajado-lanterna em riste para lhe mostrar o caminho, enfim, por ora, tudo o que conseguimos dizer, para ilustrar o caso com uma expressão popular, tão comuns nesse relato, e tentando, com os parcos recursos da escrita, reproduzir o tom apropriado com que isso seria dito, que “Adenílson?!, hum!, Adenílson tremia mais que vara verde, gente!”. Ele mal podia conter o vômito que, se saísse, iria revelar que ele bravamente havia segurado a coxinha junto de si ao cair em cima do rapaz, quando do incidente na hora do recreio, e depois havia, sim, comido a coxinha toda, mesmo sob o estresse e o trauma da agressão verbal e da ameaça de agressão física trazida com aquele veredito que ecoava na cabeça daquele verme de deus, “tu vai ver na hora da saída”, “tu vai ver na hora da saída”, “tu vai ver na hora da saída”, a cada mastigada, a cada engolida a seco, e a cada golada de água do bebedouro pra desembuchar depois, já que, como se sabe, o refrigerante havia se esparramado todo sobre a camiseta do rapaz, deixando-a toda molhadinha e permitindo aos que o rodeavam entrever, por baixo do tecido tornado transparente pelo líquido ali derramado, as protuberâncias de seus mamilos tesos de pit-bull marombeiro sarado. Agora, Adenílson vinha descendo o caminho que dava para a saída do colégio, tremendo mais que vara verde, já havia visto de longe o seu agressor, que estava encostado no muro em frente à saída da escola, rodeado pelos amigos, todos com atitudes ameaçadoras enquanto fumavam seus cigarros mistraga, o agressor estava com um pé encostado no muro, e, com a mão que não segurava o cigarro, segurava displicentemente o caralho por cima do moletom, e, mesmo com tanto terror se apoderando dele a cada passo que dava em direção à saída, Adenílson não pôde evitar de ficar com o pênis em estado de semi-ereção diante daquela visão, havendo até uma gota de esperma manchado sua cueca, afinal de contas, o agressor era um “puta macho gostoso do caráleo!”, e a psicologia está aí pra explicar, ou não, esses lances malucos de atração sexual, simpatia sentimental, identificação ideológica, síndrome de estocolmo, o raio que o parta, que rolam entre agredido e agressor, mais uma vez queiram os leitores poupar o narrador de se deter em miudezas psicológicas que iriam entravar ainda mais um relato já muito entrevado pelos insistentes comentários intromissivos e impertinentes dessa bicha faladeira que é esse narrador.
– Fala sério, o cara não continua a história, vou já parar de ler essa porra e ir tomar um café...
Então vai lá, a gente CONTINUA na semana que vem...


Nenhum comentário: