Graças a isso, Luisinho
conseguiu virar-se a tempo de desviar-se do golpe traiçoeiro do agressor,
abaixar-se e dar-lhe um soco na boca do estômago, o agressor imediatamente se
recurvou, sem ar, Luisinho não perdeu tempo e lhe mandou mais um soco, no
queixo, um gancho vindo velozmente de baixo, que foi a deixa para um verdadeiro
combo, o agressor cai de joelhos, Luisinho o pega pelo colarinho, e daí uma enxurrada
de socos metálicos e perguntas retóricas, “quem é viado agora, féla da puta,
hem?, fala, caraleo, perdeu a língua?”, etc, começam a chover na cara do
agressor subitamente colocado na posição de agredido, de invadido pelo ódio e
pela ira de se ver derrubado por um dos seus melhores comparsas.
– Viado, sim, mas na dele,
gente boa, e errado todo, deixa ele entrar pra galera pra ver como ele se
comporta, foi isso que o agressor havia dito aos outros da gangue quando
conheceu Luisinho, e agora o agressor tinha que engolir a humilhação de estar
levando uma surra de um cara que um dia foi seu amigo mas que agora não passava
de um viado escroto féla da puta defendendo uma bichinha fuleira, e dominando
tudo, lá no fundo daquele psicológico cada vez mais e mais em frangalhos, um
sentimento que era familiar ao agressor, mas o qual ele trancava numa sala cuja
porta ele evitava abrir, só que agora esse sentimento se revoltava, retorcia-se
nos seus grilhões, espancava a porta da cela em que jazia aprisionado e fazia
chegar seu nome aos ouvidos do agressor, MEDO, MEDO, MEDO, o mesmo medo que o
fazia viver sua vida agredindo e odiando a tudo e a todos, o mesmo medo que,
desde que a briga havia começado, estava fazendo cócegas nos amigos do
agressor, que olhavam tudo sem saber o que fazer, nenhum deles na verdade
queria confusão, estavam realmente com medo de que, por qualquer coisinha, eles
fossem mandados para a Febem, medo infundado, já que porra de Febem nem existe
mais, mas foi para lá que disseram haver mandado o moleque que havia dado uma
pedrada no outro.
– E ninguém nunca mais viu
nem sombra do Pedreiro, diziam os estudantes, que é como o rapaz que havia dado
a pedrada no outro ficou conhecido depois, além do mais a escola estava visada,
essa história da pedrada havia sido péssima para a imagem da educação pública
estadual, imaginem as manchetes sensacionalistas dos jornais das oposições
coligadas, Garoto Morre Apedrejado Em Escola Estadual ,
foi horrível, até porque o garoto nem havia morrido apedrejado, ele havia
levado uma pedrada só, bem no meio da cabeça. Certeira? Fatal? Seja! Mas havia
sido uma só, mesmo assim, o diretor estava decidido a evitar que cousas dessas
se repetissem, e já havia começado a implantar medidas e baixar decretos
severíssimos, alterando normas e estatutos de alto a baixo em nome da segurança
escolar, por isso, os bandidinhos do colégio estavam, como já havíamos dito,
com as barbas de molho, mas a indignação e a revolta de ver seu líder levando
um piau de um viado acabou tirando os caras da trincheira e da letargia, só que
aí, no momento em que eles decolavam do muro para ir tomar satisfações com
Luisinho, isto é, partir-lhe a cara como ele havia feito com o seu líder,
moer-lhe de pancadas como se ele fosse um cão sarnento, uma viatura da polícia
apareceu do nada, coisa impressionante, liguem para o 190 e peçam uma viatura
para ver o tempão que ela leva para aparecer, quando aparece.
– E vem aparecer uma bem
na hora que neguinho ia baixar o cacete naquele viado escroto – era assim que
um dos comparsas do agressor iniciaria, horas depois, o parágrafo final de sua
narração sobre o episódio.
– Eu estava lá e tenho
certeza que foi a minha prática do sonen, que eu comecei a fazer na hora que a
briga começou, que fez a polícia aparecer tão rápido – era assim que explicava
aquela presta aparição policial uma jovem nerd que freqüentava a igreja
messiânica, fazer o quê, no Brasil tem coisas que só o sobrenatural pode
explicar. Os policiais desceram da viatura, eram três, e, imediatamente,
partiram pra cima de Luisinho, de revólver em punho, zurrando aquelas pérolas
típicas do jargão policial.
– De frente pra viatura!
– Mão na cabeça vagabundo!
CONTINUA...
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