quarta-feira, dezembro 4
Do tempo
O tempo me esquece e sinto minhas unhas irremediavelmente transformarem-se em garras. Estas adentram minha carne e me despedaçam em três.
A tríade Aristotélica, fruto da passagem do tempo pelas minhas mãos, envelhecendo-as, engradecendo o tato, criando habilidades cirúrgicas para o conserto de minhas juntas, e para o zelo com meus calos.
E o tempo cruel arrasta-se em triângulos desenhando minhas expressões faciais e pintando as cores do meu esmalte, e bordando as rugas dos meus risos.
Aplica-se em minha alma a teoria da relatividade, mitigando meus dogmas e meus preconceitos, acalmando minhas preces e extirpando minhas dúvidas. A fé devora meus encantos e meus defeitos, e a mesma fé rasga a sola dos meus pés, colocando-me em eterna provação.
O tempo é colaborador da sapiência, e cicatrizante das feridas. Aerossol de tempus verbum.
E ressuscito a deusa que me habita o corpo, reanimando a própria com sua forca, fé e esperança. E minha deusa esquece o tempo e faz deste teu servo e teu escudeiro. E minha deusa escreve com meu sangue e deságua minha mente no papel.
Minha mente iludida e derretida entrega a cera quente - que são minhas opiniões - aos leitores, arrancando seus cabelos sem sombra de compaixão. E minha mente, palhaça com palavras, prega pecas na deusa que habita meu corpo, e com a alma, refaz minha fé.
E o tripé que me sustenta segue manco, compassado pelo tempo que tatua a minha pele de forma invisível, e concretiza as pegadas na calçada não famosa da minha vida.
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