JESUS DE JEANS E MARIA DE CABELO VERMELHO

- Vamos nessa, please (risos). Não vamos desistir, agora?
- Não sou disso. Parece que você ainda não acredita em mim.
- Tem medo de alguma coisa? Te assusta a altura?
- Nunca. Quero ver de lá o chão! De lá o céu.
- Você está tão poética... Não te conheci assim!
- Vai te lascar (risos). Me de as mãos, vamos lá!
- Ei, esse papel não é meu?!
- Não te conheci assim... machista( risos) .
- (risos).

Subimos a escadaria em quatro passos largos e nos detemos por alguns segundos no arco da entrada da igreja barroca, dava pra ver a nave ao fim das colunas com um senhor de batina marrom andando e falando com ar de sabedoria e experiência tamanha no assunto.
Entramos ouvindo a voz do advogado de deus.



“ E disse ... Um homem tinha dois filhos. O mais jovem disse a seu pai : Pai, dá-me a parte que me cabe da herança ...”

Parou por um tempo o sermão e olhou pra gente com piedade e superioridade, os pouquíssimos fiéis que estavam em pé viraram as faces pra nós curiosos e assustados.

- São ladrões? - escuto um gritinho agudo de uma velha baixinha e grisalha com um terço rosa espremido na mão. Não escutei a resposta e nem sei se teve, pois logo dobramos a esquerda e pegamos uma escada com degraus de comprimento curto que subia por círculos e círculos e
Subimos e subimos ainda com as mãos dadas. Você ria cínica e atéia e percebi sua expressão de sádica. Continuamos subindo os degraus em círculos, círculos, círculos e ao topo tontos stop. E no último degrau sento e você com a mão na barriga respira ofegante. O ultimo estorvo: uma portinhola de madeira. Madeira de lei. Talvez mogno. Enegrecida e com buracos de cupins que faz sua vida e morte ali. Está meio aberta, donde fogem discretos raios do sol poente que iluminou nosso percurso dagora. Ela tiras as mãos da barriga empurra e range a portinhola. Nos agachamos e passamos pelo pequeno arco e uma série de pombos bracos, cinzas., pardos, pretos, brancos, pretos voaram ao céu num puta escarcéu.

- Thau pombos. Levem boas noticias aos senhores! Caguem nas cabeças dos idiotas!
- Engraçadinho... minha rinite alergica acho vai atacar com tanta poeira e merda.
- Hum... vai não!

O enorme sino de bronze que os portugueses católicos um dia trouxerem além-mar está ao nosso lado parado, coitado e sozinho com sérios problemas de ferrugem e sujo das merdas dos pombos (que dão um charme fotográfico a qualquer lente de um turista).
- Acho que os dízimos não andam chegando até aqui, devem acabar no estômago do sábio lá em embaixo.
- É vero... Você está cansado?
- Não. Acho que bati em algo... dói algum osso aqui no pé.
- Levanta e toca o sino.
- Toca você, medrosa!

Rápida à minha contra-resposta. As finas mãos seguram a grossa corda desviada e inicia um movimento pra lá e pra cá, pra cá e pra lá repetidas vezes pra lá e pra cá. Seu rosto foi se iluminando de coisas que não conseguiria exprimir em um texto ou em versos. Só e tivesse uma máquina fotográfica.

BEMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM!

- Uau! vou ficar surdo, garota! (boto as mãos no ouvido)
- Eu também. (ela põe também as mãos nos ouvidos) - O bairro todo vai acordar.
- Te importa?
- Ele dormem há tempos mesmo.
- Será? É. Eles dormem a sesta todos os dias.
- Não falo disso... você me entendeu.
- Simbólica, agora? (risos cínicos)
- Me dá um beijo?
- Como?!
- Isso não estava nos planos. Viemos só pra tocar um sino.
- Eu tinha esse plano também.
- Você me trouxe até aqui pra me beijar.
- Também.Era o plano B.
- Aff.. Não precisava de tudo isso...

E ela pega com mais força a corda e toca o sino novamente.

BEMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM!

- Olha pra baixo....
- O que que tem?
- Um bando de pessoas chegando.
- Faço um comício. Digo algo para eles. Antes que chamem a policia ou o hospicio ou nossos pais. Virgem santa que fuma maconha e de cabelos vermelhos. (risos)
- Senhoras e senhores... sou a virgem santa maria que veio com este jesus de calça jeans azul (aponta pra mim) trazê-las as boas novas... disseram os anjos que se tocássemos os sinos desta igreja vocês teriam a paz que tanto desejam...
- Cuidados com os tomates!
- Cala a boca!
-... Então agora vocês seres humanos de uma terra cheia de sofrimentos, ódio, amargura, doenças, acham que se fizerem as boas ações terão o paraíso? Desculpe-lhe dizer, mas o inferno e o céu é aqui mesmo na terra.

BEMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM!