quinta-feira, maio 17

O Delirium* de Saulo


*O termo delirium deriva do latin delivare que significa “estar fora do lugar”, apesar de que hoje esta seja usado como “confuso, fora de si ou um sintoma neuropatológico etc etc”, mas o sentido a qual pus o título é o primeiro.


Diego Pires entrevista Saulo Pinto* por via e-mail.

*Economista e Professor de Teoria Econômica do Instituto Federal do Maranhão/IFMA e contribuinte do blog Tempo de Crítica  

Não há muitos dias conversando com um amigo socialista ele me afirmou: “Enquanto houver um lugar nesse planeta terra onde uma criança morre de fome haverá Marx”. Marx é a verdade?


Eu conheci Marx em um desses funerais! Na verdade, em cada período histórico, abre-se uma janela dos desesperados em que a ignorância em estado puro alimenta todos os irracionalismos possíveis… O que realmente Marx fez foi justamente construir uma “crítica impiedosa a tudo o que existe”, conforme disse em carta ao seu camarada Arnold Ruge. É óbvio que, em tempos pós-modernos, o pensamento enquanto uma objetivação está liquidada. O que é produzido nas universidades são mercadorias, fragmentos de pseudo-pensamentos que têm como característica nada dizerem. Na verdade, quanto mais folclórico e exótico for o “não-dizer” dos mercadores do saber, mais entusiastas adotarão em blocos organizados uma militância em nome das modas “novidadeiras” de elogio a tudo o que existe. Marx considerava toda falsidade como o “falso” socialmente necessário, na manutenção das ilusões indispensáveis à reprodução das condições objetivas-subjetivas do capitalismo mafioso. Assim, é estranho que todas as epistemologias não marxistas, por exemplo, advoguem uma espécie de neutralidade do discurso sobre a verdade que, em hipótese, Marx sustentaria. Nada mais falso! Marx produziu uma ontologia do ser social e toda natureza humana é historicamente condicionada pelo modo de vida de um padrão de sociabilidade determinado. As coisas caem para baixo e não para cima! Isto significa que a verdade não está em Marx, mas nas contradições e nas potências deste modo de regulação social. Onde quer que exista capitalismo, certamente, existirá a necessidade objetiva-subjetiva da crítica ao que existe. Pois, o modo de destruição do capitalismo exige  sua necessária e irrevogável superação. Marx existe de maneira inabalável enquanto as condições objetivas-subjetivas do capitalismo mafioso existirem e seu porrete será erguido por todas as gerações que não se renderem às seduções da vida estranhada. De todo modo, precisamos formar marxistas-poéticos… O que seria a revolução total senão uma grande poética inaudível? Na verdade, acho que faço parte de um marxismo não-alinhado e enquanto tal parece-me difícil ter hegemonia, mesmo entre “nós”… É preciso dar um passo adiante, com pedradas e palavras, pelo comunismo!


Há 8 anos voto na legenda do PSTU apesar de não ser Socialista, mas acredito que seja o único partido honesto e capaz de um Revolução no miserável Maranhão e subsequente quebra das Oligarquias (Utópico e Anacrônico? Não sei.)  Pensas como eu?

Um partido comunista é um sempre um intelectual orgânico, é sempre uma “totalidade destotalizada”, plagiando J-P Sartre, como negativo do que existe realmente. Fui militante do PSTU e, ao contrário de muitos amigos socialistas e comunistas, respeito bastante esta organização. Mas estou hoje “fora” … Todavia, o PSTU é um partido da separação e como tal não pode ser mais do que o negativo. A afirmação socialmente necessária e capaz de gerar uma situação irreversível depende, necessariamente, funda-se no pluralismo socialista-comunista. Tenho dificuldades teórico-práticas em compreender o processo de “revolução total” sem a participação do maior número de organismos e proto-organismos de “guerrilha”, isto é, entendo-os como instrumentos mediadores para a “Guerra de classes” que se processa organicamente no interior das contradições do capitalismo mafioso. Assim, o PSTU é um partido importante, honesto, de lutadores e lutadoras, mas não possui a ontologia da luta, são parte necessária dela e indispensável para a sublevação total da nossa classe, dos explorados oprimidos e humilhados, mas repito, não são a vanguarda da vanguarda da “revolução total”. Ainda assim, penso!, quem vem primeiro, a vanguarda ou a retaguarda? … A revolução proletária brasileira exige um determinado pluralismo socialista-comunista. Não há outra forma, não há remédio, não há atalhos… No que diz respeito ao Maranhão, tenhamos calma! Trata-se de uma quadrilha que se organiza na forma de máfia para estabelecer e reproduzir de maneira indefinida seus poderes, mediante a reprodução de relações burocrático-patrimoniais infinitas. Não gosto da crítica moral à oligarquia, parece algo infantilizado… A única crítica relevante tem que brotar da esquerda radical. Sem uma política e uma crítica radical, teremos apenas uma disputa de poder intra-oligárquica, que enganará o proletariado de todas as flexibilizações a depositar sua confiança nas eleições burguesas, este velho cardápio de mentira e cinismo em estado puro. Temos muitos pseudo-intelectuais que comem e vestem à custas da existência dos “sarney”… Penso que existe a necessidade social do surgimento de uma nova geração de críticos radicais no Maranhão… Não estou convencido do que dizem por aí… Fico imbecilizado de tanta besteira! … Sei e reconheço que existem o Flávio Reis e o Flávio Soares, mas o que resta depois? … São dois críticos muito inteligentes, sagazes e, pasmém!, anti-acadêmicos, seus colegas da universidade não os aceitam (risos…), ainda bem! Não estão perdendo nada… Eles desconhecem isso, mas “nós” (um pessoal descartável para o partido dos idiotas com doutoramento), os mais marginais de todos, gostamos deles! … Só lembrar do título do último livro do Flávio Reis, “Guerrilhas”… Quem teria coragem e ousadia de dar a um livro um título tão anti-acadêmico? … Os doutores em bobagens preocupam-se com seus currículos acadêmicos… Os intelectuais têm horror à luta, aos pobres, ao pensamento radical, pois têm horror à qualquer revolução!

Ouço de amigos: - sou pós-moderno. Parecendo assim negar a barbárie da realidade ou mesmo dizer que esta acima de tudo isso ou ter uma leitura errada do termo, pois ser pós-moderno não é necessariamente negar a “luta de classes”. E assim o tal do “Sistema” continua esmagando com suas botas selvagens o pescoço do mesmo... Por favor, me corrige se estiver errado?

Risos… Marx fundou a pós-modernidade… No único sentido realmente válido socialmente. Ele inaugurou uma nova forma de fazer ciência e filosofia, sugerindo uma modalidade em termos de praxis para a mudança total do mundo. A crítica à modernidade é uma forma de deslocar a centralidade do modo de produção do capital para algo difuso, sem qualidade, desprovido de intencionalidade. O pós-modernismo centra seu fogo na crítica às grandes narrativas, ao sujeito do conhecimento, à pretensa identidade de classes, e outras banalidades básicas. Na verdade, o pós-modernismo produz sua pseudo-crítica ao marxismo, mas estipula em termos de crítica à modernidade! E qual seria o motivo? Trata-se de uma ideologia própria ao tempo histórico do imperialismo! … Lukács formula bem esta questão, mostrando uma correspondência necessária entre formas de dominação econômica e decadência cultural. Então, penso que o pós-modernismo que tem em Nietzsche e, depois, em Heidegger seus expoentes mais importantes, formula sua crítica ao progresso, opondo-se à Revolução Francesa com todos os seus atributos importantes e, portanto, da necessária superação do velho pelo novo, de toda forma de superação do existe pelo processo de “revolução total”. Trata-se, sem dúvida, de uma forma aristocrática de formulação intelectual em contrapartida a toda necessária formulação democrática emancipatória, etc… Os pós-modernos são bárbaros, novo-bárbaros! … Assim, não há saída nem muito menos nenhuma alternativa radical e historicamente irreversível na doxa pós-moderna… Como já disse, precisamos recomeçar por Marx…

Mudando um tanto de assunto. O seu espaço no blog no “Tempo de Critica” me lembra, às vezes, o poema adaptado os “Os Patos de Rui Barbosa” do português Joaquim Custelo. Quem é seu público? Pois a imensa maioria fala outra língua.

Não conheço este poema. Não temos público, na verdade, temos inimigos e alguns poucos amantes. Certamente, se alguém perde seu tempo lendo nossos textos e ensaios, deve ser a polícia, os especialistas em segredo! Os ideólogos ineptos imbecis dos “grupelhos” burocracos-patrimoniais que estejam querendo aprender a escrever (risos…). Pulando a acidez, não sei quem são nossos leitores… Primeiro, não escrevemos nada demais, apenas misturamos, eu e Vinícius, delírios de mesas de bar, alguns sentimentos reprimidos pela sociedade do estranhamento, algum pitaco sobre uma sublevação na esquina…  Têm pessoas que dizem que não entendem nada, mas continuam acessando às publicações do blogue… Não entendo! … Na verdade, sinto-me invisível, sinto-me “fora” sempre, um precarizado e descartável flexibilizado… Muitas vezes já pensei em sair do blogue, em tornar-me um “eremita na cidade” (risos…), mas não dá! … o problema é quero mudar o mundo e isolado isto se torna uma impossibilidade ontológica… Na verdade, tenho percebido que é possível dialogar com alguns públicos bem juvenis, mas pequenos grupos… Eles têm vida, pulsão, mas estão jogados ao mundo cotidiano do desfiladeiro… Antes que se joguem de vez, temos que freá-los… Se não fizermos isto, acho que vão virar “gentes sem qualidade” nenhuma… Vamos parar por aqui, tenho que voltar para os delírios…


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