I
A minha alma foi fatiada
Finas lâminas de alma, servidas
com limão,
Na tua bandeja de prata.
Você espeta o garfo em cada
pedaço,
Saboreando meu doce gosto de
derrota.
Cry, babe, cry.
II
Quantos gramas de alma quer levar
hoje, senhor?
Quer levar pão integral para
acompanhar?
Essa veio de um ótimo
frigorífero,
Abatemos essa alma humana semana
passada, extremamente macia.
III
De primeira havia um quarto
vermelho gritante, talvez e tão somente para aumentar o desespero daquele
momento. Ataduras nos braços como se fosse manicômio, mas talvez era um
manicômio, não? E, para completar, água amarga para beber. Matar a sede com
aquela água amarga não teve preço, e já que fazia dias que estava sem tomar
qualquer gole de vida, bebeu aquela jarra como se fosse mel.
Fotografias dos dias felizes
grudadas com imãs nos batentes das janelas, trancadas com grades impenetráveis
até pela luz solar, apenas para lembrá-lo de que conhecia o céu, mas iria ao
Inferno. Estava só, não estava? Estava são ainda? Aqueles robôs brancos não
tinham olhar, e nem falavam.
Dois meses, esse foi o tempo do
que eles chamaram de purificação. É o tempo em que demorou também para se
deixar de querer viver, em que o amargo da água se tornou insuportável, em que
a alma estava louca de vontade para
partir. E saiu, por um tubo azul, que a depositou em um pote de plástico, feito
gelatina.
E o que restou desse corpo, cuja
alma foi sacrificada servindo de alimento a outrem? Pergunto-me dia após dia,
enquanto cicatrizo as marcas dos catéteres.
IV
Alma é aquele pedaço de si,
invisível a olho nu, que em outros tempos achávamos que imbuía o corpo com
graça e leveza. Mas o mundo deu voltas para o lado errado, e hoje há pessoas
que perderam sua alma em meio à guerra, ao álcool e ao pântano. E desses, quem
pode compra almas enlatadas, vendidas num comércio ilegal (que é protegido até
pelos governos).
Mas para quem não tem alma,
alívio da consciência se torna desnecessário.
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