Não me reconheço mais. E
não adianta me olhar no espelho durante uma hora seguida ou perguntar pra
alguém quem eu sou. Rio sozinho. Tenho vontade de empinar pipas e bater uma
bola. Ser o prefeito da cidade. Assaltar
bancos com amigos. Matar Sarney a queima
roupa e ser manchete nacional com muito orgulho. Ontem pisei num caco de vidro
e vi o sangue escorrendo e nem parecia que era meu. Nem dor tive. Foi estranho
assim como meus sonhos ultimamente. Tantas pessoas que nem conheço estão neles.
Coisas malucas. Vi um homem em ritmo frenético transando com uma mulher e
depois o esperma branco e aquoso saindo pelo nariz e pela boca como se a mulher
acabasse de ser retirada de um afogamento.
Não vejo o futuro de forma clara e nem dou palpites. O passado tento
relembrar nas fotos em cima da estante na sala e nem quero saber de livros de
História. O presente é esmagador assim como o calor da ilha e os pensamentos.
Bebo água como se tivesse caminhando por um deserto sem cor numa eterna
diáspora. Dá pavor pensar em faltar grana pra comprar água e eu morrer desidratado.
Antes sentia dó pelo mendigo da esquina da minha casa. Agora não tenho mesmo tempo
pra isso ou talvez seja eu o próprio o mendigo e outros é que me vêem com dó. O
cabelo cresceu, as unhas, o desvio na coluna, a paranoia. Tenho um canal pra
fazer no segundo molar inferior direito.
O mundo ta cada vez mais sem pé nem cabeça ou sou eu ou os dois. Não
codifico os signos. Medo de parar num hospício como um personagem que criei.
Sou um pouco dele. E isso aqui não é um conto, um poema, um desabafo, um vômito
a la Caio Fernando Abreu ou uma espécie de diário. É uma necessidade como
cagar, mijar, comer, fuder. Não há começo, meio, onde, quando, estilo, final
de efeito, muito menos dor ou prazer, mas vai ter um título como quase
tudo. É isso e pronto. Faz parte. Não
tem onde chegar essas palavras. Sei que tou com um tersol no olho esquerdo e
ele furou e isso significa que está próximo de ficar bom.
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