quinta-feira, junho 14

Capitão-Mor[bido]



A boca amarga de tanto cigarro afirma a ociosidade, o mundo parece parado e uma energia dentro si o agride, não existem canos para manipular ou mesmo direcionar tanta força e aspirações, o dia parece ser o mesmo no passar das horas, nada acontece, as mensagens não chegam, o aviso não é dito, as afirmações não são concretas e quando menos se espera uma semana se foi e um mês se foi. A aventura chega ao ápice no ato de observar um ninho de pardal pela janela, fazendo extensão ao notar uma mãe de penas com pena da fome de seus filhotes.



Mas a sociedade parece voraz lá fora, o dia parece tenso, o entregador passa rápido, a vizinha fala da novela e da gostosinha da rua que chegou de madrugada, no terraço a poeira e algumas correspondências, anúncios fúteis de um lava jato para alguém que não possui veículo próprio, algumas contas pendentes, mas nada que indique um futuro. Do outro lado da rua a mesma vizinha mexeriqueira faz a interrogação. “tá de folga hoje? Foi trabalhar hoje não?” quando na verdade o que passa na cabeça dela é. “Quando tu vai criar vergonha nessa tua cara e arrumar um emprego? Parasita de merda, esse aí deve dever Deus e o mundo...”

O silêncio é dado como resposta, apenas um olhar de reprovação em ambos e o ser adentra em seu refúgio.
A força cresce, a dúvida cresce o que fazer?Se lembra das críticas de seus progenitores, de algumas “namoradinhas”, tenta se mexer de alguma forma, procura no computador alguma saída, um projeto, uma ocupação, mas lembra que sua internet foi cortada, logicamente por falta de pagamento, mas isso não é empecilho “correrei pra lan house”, pensa ele, tira seu mórbido corpo de casa, coloca uma roupa sem muita estética, enfrenta o Sol e olhares reprovadores, se sente em meio a um campo de guerra onde a qualquer hora alguém o abordará pra falar coisas piegas, pífias, e o medo de isso acontecer o domina, fazendo com que pareça ignorante ou convencido (dependendo do olhar de quem o julgue).

Acelerando o passo chega à dita lan house, como se trata de um bairro periférico deve-se imaginar como se descreve esse famigerado antro, mesas quebradas, fedido, ar condicionado? Só no quarto do dono. “Mas tudo bem o objetivo aqui é outro” (mais um pensamento relâmpago). Adentra o recinto em meio a berros de crianças molambentas se divertindo com jogos altamente ultrapassados, liga o computador de tela escura e teclados duros de tanta poeira, não quer imaginar como deve está o gabinete muito menos as peças internas daquele pobre eletrônico.

Solicita uma hora, mesmo porque sua renda não permite passar uma tarde inteira ali, mesmo que permitisse a falta de refrigeração deixaria seu corpo desidratado. “vamos lá...” fala baixinho como se fosse uma única hora na Apollo 11 (ou se faz agora ou não se faz mais).

Abre a caixa de e-mail, “Compre da China, Jornal do Lar, Peixe Urbano, Faceebook, Badoo, Editora Abril...” Nada de interessante, revisa a caixa de envio, verifica que seus pedidos de emprego foram todos recebidos, apenas não responderam... Há duas semanas, outros há três meses. “tudo bem...” pensa triste.

Não sabe por onde navegar, não sabe o que recorrer, as horas vão passando e a viagem na Apollo 11 tem que cessar, imagina todos os seus amigos naquele instante, todos ocupados, pensa em ligar para algum deles, mas enfim, estão ocupados, não quer dividir essa angustia com mais ninguém.

Pensa na dificuldade de seus pais em mantê-lo quando moleque e o sacrifício que passaram pra determinar sua existência e sua vida até ali, pensa que quando nasceu seu pai não tinha emprego e que se virou pra determinar sua existência e aquilo o revolta, pois além de não ter uma ocupação, não tem um filho justamente por não ter uma ocupação, para que essa ocupação o traga verbas para manter uma famí...  “ACABOU O TEMPO!!!...” (fala a secretária da lan house interrompendo seu raciocínio sobre o que fazer dali em diante).

4 comentários:

Anônimo disse...

Isso é uma bicha travestida de ursinho pimpão, mas o texto até que é bom.

Pedro Morrison disse...

E assim caminha a humanidade, em passos de formiga e sem vontade... Agora falando sério a respeito do texto, não sei o porque mas, acredito q conheço alguém que se enquadre nesse texto. E realmente gostei da parte da vizinha mexeriqueira.

Abraço e bom texto Jorginho

Natan Castro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Natan Castro disse...

Ai baixista, teus textos são sempre carregados de uma tensão pungente, realidade nua e crua, Depois sempre lembro do que Ferreira Gullar nos diz, que somente a arte pode explicar o absurdo de viver.


Natan Castro.