No
dia 8 de março foi exibido o último capítulo da novela da rede globo, lado a
lado, bem diferenciado em relação as demais teledramaturgias que já foram
exibidas pela emissora.
A novela mostrou a história do Brasil no período pós-monárquico-escravista e inicio da república, recheado de excelentes atores, entre eles, o Lázaro Ramos, Camila Pitanga, Marjorie Estiano, Tiago Fragoso, Patrícia Pilar, Milton Gonçalves e muitíssimos outros, com personagens sociais que viveram no período citado.
A
teledramaturgia focou nas duas personagens: a Laura Vieira interpretada por
Marjorie Estiano e a Isabel por Camila Pitanga. Duas mulheres com realidades
bem distintas, a primeira filha de barões, escravocratas e falidos produtores
de café que tinham poder e status no regime imperial-monárquico-escravista, a
segunda filha de escravos, não tinha perspectivas pelo fato de ser pobre e
negra, apesar da abolição do sistema escravagista, sofria cotidianamente o
preconceito e a discriminação racial, que forçava a exercer somente a profissão
de doméstica.
Realidades
distintas, as duas personagens resolveram lutar contra o preconceito e as
injustiças, mulheres além do seu tempo e do pensamento de uma sociedade
conservadora e reacionária, mas ao mesmo tempo mesquinha e hipócrita.
A
personagem Laura Vieira, personificava uma mulher inconformada a submissão
feminina ao machismo masculino imposta pela sociedade, umas das atitude foi
pedir o divorcio ao marido, o Edgar Vieira interpretado pelo ator Tiago
Fragoso, numa época em que o divorcio era inadmissível e a mulher carregava
todo o sentimento de culpa, principalmente por ser solteira ou rejeitada pelo
marido.
Outro
fator considerado escândalo para a sociedade nesse período, era a da mulher
trabalhar fora de casa, principalmente nas profissões consideradas degradantes,
como no caso da Laura que trabalhou numa sapataria como atendente em que ela
teve que abaixar-se para colocar os sapatos nos pés dos clientes, causando o
constrangimento a sua mãe, a Constância ou a Baronesa da Boa Vista, por não
aceitar a sua filha trabalhar nessas condições e não ser alvo de chacotas das
senhoras e da alta sociedade carioca.
Perdeu
o emprego de professora numa escola de freiras quando foi descoberta que era
divorciada, foi hostilizada em todas as repartições onde frequentavam as
senhoras da alta sociedade, foi trabalhar de secretária para o amigo do seu
pai, que também é senador da república, sofreu tentativa de abuso sexual pelo
amigo do seu pai, mas se passou a culpada por tudo, porque o pensamento da
sociedade naquele período é se ela fosse casada e estivesse em casa cuidando do
lar, dos filhos e do marido, nada disso havia ocorrido.
Daí você vê a ojeriza ao trabalho, que não está associada somente aos pobres e malandros, a própria elite também tinha aversão ao trabalho, principalmente nas profissões destinada aos pobres, no caso, a imensa maioria de negros e ex-escravos.
Quebrando
assim o paradigma de achar que a malandragem e a aversão ao trabalho está
associada somente aos pobres, pelo contrário, as classes dominantes tinham
aversão também, talvez bem mais que os pobres, não é a toa que o poder e status
sempre está associada ao estado, tipo, ocupar o cargo de alto escalão do governo,
ter amizade e influencia com a classe politica, ou seja, usam o estado para
manterem os seus privilégios e ficarem longe do trabalho.
Enquanto
a Isabel, essa lutava contra o preconceito e a discriminação racial, não via em
si perspectivas para melhorar de vida devido ao fato de ser pobre e negra, e
ouvia de terceiros que passaria o resto da vida trabalhando na casa de famílias
de senhores de escravos.
Excelente
dançarina do samba partiu para Paris fazer carreira artística e divulgar a
cultura do Brasil na Europa, cultura esta fortemente rechaçada pela elite
intelectual como também pela elite da capital da república, o Rio de Janeiro,
devido ao fato de ser uma manifestação cultural de escravos nas senzalas.
Devido
a isso, os jornais criticavam ferozmente a dançarina brasileira em Paris, por
alegar que estava se apresentando a selvageria e barbárie do país ao exterior,
mas por trás dessas críticas, era o fato de uma negra estar fazendo sucesso e
consequentemente ganhando muito dinheiro, o que era inimaginável no período
pós-monárquico.
Porque
era inimaginável um negro estudar numa faculdade, negro ganhar dinheiro honestamente
e com uma profissão digna sendo chamado de doutor, a Isabel estava ganhando
prestigio e o respeito que nunca havia ganho no Brasil, o que causava ira e
certa inveja das classes dominantes.
Na
tentativa de desqualifica-la, acusavam de ter se prostituído nos anos que morou
na França ou de dançar nua no palco, numa sociedade que pregava a moral e os
bons costumes em nome da família e da igreja.
Teve
um filho fora do casamento, fruto de uma relação com o filho da baronesa da Boa
Vista, a Constância interpretada pela atriz Patrícia Pilar, considerado
escândalo para a alta sociedade ter um filho mestiço, Constância tomou a
criança da Isabel, a mãe, e escondeu o seu neto para que ninguém soubesse que
ela tinha um neto mulato, e plantando a noticia que havia nascido morto.
Eram
tempos em que a mestiçagem de negros com brancos, sinhozinhos com as escravas e
casa-grande com a senzala eram negadas pelas classes dominantes e ocultar a
mestiçagem que havia nos filhos de senhores com as escravas.
Outro
fato interessante explorado pela teledramaturgia foi a negação das mulheres de
escreverem em jornais, exceto para falar de religião ou receitas de bolos, a
Laura Vieira para escrever um artigo de jornal teve que criar um personagem
fictício com o codinome de Paulo Lima, porque as mulheres naquele período era
inimaginável a mulher discutir politica, num universo totalmente dominado pelos
homens.
Entretanto,
a personagem Constância deve ser lembrado não como o exemplo de mulher que
tentou mudar a ordem vigente, mas por ter também o poder de decisão e
influencia, principalmente na ausência do homem quando este se encontra fora do
lar e dos momentos decisivos.
Ela
defendia assiduamente a imagem de sua família, para que não envolvessem em
escândalos, principalmente feita por seu filho que no inicio da trama levava
uma vida de aventuras e desregrado, típico sujeito de uma família rica que não
quer saber de trabalhar e estudar, somente viver à custa dos pais, e justamente
este é que engravidou a mulata Isabel que a sua mãe (Constância) foi obrigada a
esconder a gravidez e consequentemente a criança por ser mulato.
Constância
fazia de tudo para livrar a imagem da sua família em escândalos, pois sabia que
seria alvo de comentários maléficos da própria classe que pertencia, a
tentativa de proteger a Laura para que ninguém soubesse do divorcio foi uma
prova disso ao longo da trama.
A
novela também retratou alguns fatos que fazem parte da história do Brasil, como
a revolta da chibata em que os marinheiros eram castigados fisicamente com
açoitadas, apesar de a escravidão ter sido abolida há mais de 20 anos, somente
no decreto, pois na realidade a escravidão esteve bem presente ao longo da
novela.
Capoeira
e o samba eram caso de policia em que os negros eram constantemente perseguidos
e reprimidos violentamente, o futebol no inicio do século XX era praticado
somente pela classe dominante, ou seja, pela elite branca, negro era impedido
de jogar entre os brancos. De onde veio a expressão “pó de arroz”?
O
personagem Zé Maria interpretado pelo ator Lázaro Ramos sofreu todo tipo de
preconceito de discriminação social e racial por ser negro e pobre, e também
por ter praticado capoeira, foi açoitado durante os anos que esteve na marinha
que resultou na revolta dos marinheiros pelo fim dos castigos físicos.
Sabendo
falar inglês, algo incomum nesse período, o personagem teve dificuldades de
conseguir um emprego decente mesmo com a qualificação, por causa da sua cor da
pele, foi assim ao assumir a administração da fábrica do personagem Bonifácio
Vieira interpretado pelo ator Cássio Gabus Mendes, que não aceitava na sua
empresa por fato de ser negro.
O
outro fato retratado pela telenovela foi à questão da demolição de casarões e
cortiços, resultando no despejo dos negros e pobres que viviam no centro da
cidade do Rio de Janeiro e foram obrigados a irem aos morros, formando assim as
primeiras favelas na capital da republica nesse período.
A
novela exibido pela rede globo é diferenciada em relação as demais novelas
exibidas anteriormente, parece que a emissora resolveu a fazer uma excelente
teledramaturgia, como o Bem Amado e o Roque Santeiro, por exemplo, feito pelo
dramaturgo Dias Gomes.
A
emissora merece créditos? Não! A novela lado a lado teria muito mais brilho se
fosse exibida no horário nobre no lugar do Salve Jorge, porque é o horário de
maior audiência em virtude de milhares de famílias sem encontrarem nos lares
após o longo dia de trabalho, principalmente as classes mais pobres que muita
das vezes não tem opção de terem o acesso a canais fechados com outras
programações que podem ser bem mais atraentes.
O
horário das 6 que foi exibido o Lado a Lado não tem tanta audiência porque
muitos trabalhadores nesse horário estão saindo nos seus locais de trabalho com
destino as suas casas, enfrentando o complicado transito que vivem engarrafado
nesses horários nas cidades com os ônibus superlotados em que muitas das vezes
demoram para chegar nos pontos e até chegar aos bairros, e acabam fazer a massa
de trabalhadores chegarem em suas casas justamente nos horários que são
exibidos o Jornal Nacional e em seguida a telenovela.
Crédito
a Globo terá se reprisar essa novela ou fazer outra teledramaturgia de cunho
histórico, político e social nos horários nobres, deixando de produzir novelas
que não tem cunho social algum, que é mais alienação e longe da realidade das
milhares de famílias que assistem as suas programações.
Em
vez de dar crédito a emissora, daremos aos diretores, dramaturgos e artistas
que fizeram parte da teledramaturgia, deixando o legado que podem sim fazer uma
novela de forte cunho social, politico e histórico, que abordem temas próximo
da nossa realidade e retratar um passado que não é muito distante do nosso
presente, despertando assim o interesse dos telespectadores para muitas
questões que o cerca no dia a dia como o racismo, machismo, homofobia, exclusão
e a desigualdade social, entender que isso ocorre devido ao modelo de sociedade
em que vivemos herdada pelo sistema escravista responsável pelos males vigentes
nos dias atuais.
Desconstruindo
assim muitos discursos que é produzido como a “democracia racial”, que no
Brasil não existe racismo e as classes sociais vivem em harmonia entre ricos e
pobres, que não realidade não e nunca foi de forma harmoniosa, e sim de forma
preconceituosa, discriminatória e excludente, e que a formação das primeiras
favelas no país se deu pela exclusão social que os negros e pobres viveram e
ainda vivem nos dias de hoje
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