A idéia lhe surgiu aos oito anos quando tinha um grau de miopia e ganhou de presente de crianças Alice no país das Maravilhas. Iria escrever um clássico da literatura mundial. Passou a ler todos os livros de casa, todos os livros da biblioteca da escola e todos os livros da biblioteca da cidade, somente os clássicos, é claro. Aos 20 anos evoluiu para oito graus de miopia e adquiriu hemorróidas, em compensação, leu todos os clássicos da Literatura Mundial, apesar de Ulisses ter demorado mais que o comum.
Porém sua cabeça ainda estava cheia de dúvidas, porque não sabia se escrevia ao estilo neojornalistico de Truman Capote ou o psicológico de Machado de Assis. Pensava pretensiosamente escrever um clássico com um toque realístico fantástico de Gabriel Garcia Márquez com uma atmosfera claustrofóbica de Franz Kafka e uma coisa sombria de Edgar Alan Poe.
Quando fez trinta anos escreveu a primeira frase do livro. “Por entre um bosque esquio de flores sensíveis existia uma criatura catatônica...” Sabia muito bem que a palavra catatônica saiu de algum conto de Edgar Alan Poe. Então sua cabeça estancou. Um completo branco. O resto das palavras não apareciam. Seu insight teve um curto circuito. Refletiu que estava com falta de inspiração e correu a sua biblioteca particular de mil livros e resmungou de raiva, pois faltava um, pois emprestou a contragosto Dom Quixote pro seu vizinho policial. Ia relê-lo, quem sabe ali alguma inspiração? Já tinha relido insuficientemente oito vezes. Decidiu ir atrás do precioso livro.
Tocou a campainha do vizinho oito vezes e ninguém veio atendê-lo, mas a luz da janela do quarto estava ligada. Corajosamente pulou o muro e espiou o quarto. O vizinho estava transando com a mulher mais bonita da rua. Sentiu uma profunda inveja. Recentemente se masturbou fantasiando com aquela mulher. Mas logo a inveja deu lugar ao ódio, pois viu Don Quixote estirado no chão com as folhas abertas. Era capa dura e ótima tradução.
Os amantes perceberam a sombra de um homem urrando na janela e ambos acharam que era um ladrão. Aturdido o vizinho tirou seu revolver calibre 38 debaixo da cama e atirou em direção ao suposto ladrão acertando-lhe no meio da testa. Apesar do tiro a autopsia diagnosticou a causa mortis por ataque cardíaco.
O vizinho foi absolvido.
4 comentários:
Acho que vou ler menos e viver a prática mais...hehe
Ainda não li Dom Quixote, ele não chamou por mim...
hahhahaa eu conheci esse cara
galera tem mais de cinco anos q escrevi isso. infelismente foi inspirado em alquem.
Acho só viver no mundo do literatura é terrivel, pois há um distanciamento tamanho do mundo real. Mas... cada um faz o q quer...
diego.
Foi triste. Nem D. Quixote, nem a bela da rua...
:(
Postar um comentário